
Comecei cedo… bastante cedo para quem está numa de viajar. Mas tudo bem quando se corre por gosto não se cansa. Preparei tudo o que me faz falta. Mochila, roupa interior, umas T-shirt mais um par de calças, as coisas do costume. Levo comigo um livro, a máquina fotográfica, e um bloco de apontamentos.
Saio de casa a pé e desço a avenida. Toca à tua campainha…
Cinco minutos e ainda a porta está fechada. Não costumas demorar tanto. És muito prática e não trazes muitas coisas contigo, daí a minha impaciência.
Vens à porta. Sobre ti, uma camisola que te dá um ar fantástico…
Dizes-me que não podes viajar comigo nesta minha ideia louca de dar a volta ao mundo contigo e viver momentos únicos. Não explicas porquê.
A princípio, fico triste mas percebo que tens uma guardada.
Olhas para mim e fazes-me uma proposta que já tinhas em mente:
- Entra e faz comigo uma viagem única.
Como um adolescente que vê a nudez feminina pela primeira vez, os meus lábios tremem… as minhas mãos ficam frias, como aliás é meu hábito ficar quando estou num momento tenso.
Fixas-me um olhar, daqueles que ainda ontem me permitiste ver. (Aquele que permite uma pequena viagem de imaginação de um momento a dois).
Entrei com passos leves. Cuidadoso para não esbarrar com um armário ou com qualquer outra coisa e estragar aquele momento com um movimento desastroso.
Percebes que estou tenso, pões-me a mão no ombro depois tocas-me na cara e dizes-me a frase que já te ouvi dizer mais do que uma vez:
“- Não tens porque te ficar nervoso… não te faço mal…”
Convidas-me a sentar mas a temperatura já está a crescer… O dia já começa a subir. Com ele, um sol alegre…
Vamos para o teu quarto que fica virado para o mar…
Abres a cortina e ficamos ali os dois sentados na tua cama a ver cada onda que se estende no areal. Vidraça enorme com travo de maresia.
O único risco no vidro – a linha do horizonte.
Perguntas-me para onde eu te quero levar na viagem que sonhei. Não quero revelar-te já porque gostava de fazer a dita viagem realmente e fazer-te uma surpresa mas insistes suavemente com os teus dedos sobre os meus a acabo por dizer:
- Quero levar-te a conhecer os Maoris… quero poder passear contigo naquelas imensas paisagens verdes… Sabes bem onde quero levar-te… Sei que gostavas de lá ir. Ouvi-te dizer um dia que era a viagem com que sonhas…
Talvez seja atrevido da minha parte querer ser eu a levar-te ou talvez ser egoísta querer ser eu a estar contigo… talvez… Por vezes, dizemos que é defeito ser-se egoísta, mas quando queremos alguém, também temos de o ser um pouco.
Começas a falar dos teus sonhos, das tuas viagens nunca feitas e também desejadas. Só não me dizes se queres companhia. Também não pergunto.
Normalmente não pergunto aquilo que não me dizes.
Não gosto de insistir. Conheces-me bem e sabes que assim sou.
Por vezes, fico curioso, não digo que não. Mas acho que se te perguntar fico curioso demais. As coisas que acontecem sem esperarmos trazem mais sabor.
Assim, começa uma investida tua. Tocas-me nas costas e dizes que sentes calor. O meu coração está na linha de partida. Corrida importante.
Tocas-me na pele, sinto a suavidade do teu toque. Nunca o tinhas feito antes. Estou a sonhar.
Pedes-me para viajar contigo sem destino dentro do espaço daquele quarto virado para o mar.
E eu, qual navegador sem rota traçada, começo uma viagem de circum-navegação à volta do mundo contigo ao leme.
Tens esse poder sobre mim.
(Continua…)