30 dezembro 2007

Livros… para oferecer?

Nesta época festiva, questionei-me sobre o “fenómeno” que ainda decorre quando compramos um livro.
Se compramos uma camisola, umas calças, um cachecol… na loja, dizem-nos o preço, entregam-nos o saco, dão-nos o recibo, “Muito obrigado” e pronto.
Se entrarmos num café e pedir-mos dois descafeinados mesmo estando sozinhos, não nos perguntam se o outro é para oferecer. Se pedimos dois sumos, devem pensar que temos muita sede ou virá alguém ter connosco.
Quando compramos um livro, é habitual perguntarem: “É para oferecer?”
Por que será?
Concordo que um livro é sempre um bom presente.
Para quem lê: um bom companheiro, para quem não lê, começando pelo livro certo, poderá ser a rampa de lançamento para o mundo fantástico da leitura / literatura.
Para mim, um livro é um bem tão essencial como a roupa. Podia dissertar sobre a necessidade da literatura, sobre o auxílio à cultura de cada um, para o enriquecimento do conhecimento e do vocabulário, podia falar sobre a necessidade bibliófila de ler ou de ter um livro, podia falar das histórias mais ou menos fantásticas, mais ou menos reais que nos prendem enquanto temos um livro na mesa-de-cabeceira. Mas não, escrevo simplesmente que, para mim, o livro é um bem essencial.
Vejamos, trabalho com livros: dá-me prazer, salário, etc.; leio um livro: tenho uma história, posso ter uma experiência, posso sentir-me (ou não) ligado àquela história ou a uma personagem presente; não sei o que hei-de oferecer porque o meu amigo não gosta de roupa vermelha, não sei o tamanho que veste, não conheço os gostos clubistas, enfim, se eu escolher um bom livro, gostará com certeza.
Será que a pergunta quase inevitável nalgumas livrarias “É para oferecer?” é resultado de um país como o meu?
Será que, por estarmos habituados a estudos e mais estudos que nos vendem a dizer que o meu país lê pouco, isso nos influencia de tal forma que quando vemos alguém comprar um livro, pensamos que não é um bem para o mesmo consumir mas antes um bem para oferecer?
Quando comprar um livro e me perguntarem se é para oferecer, vou responder:
“Não, é para consumir.”

O que me interessa realmente é que consumam, usem, ofereçam, sirvam como companhia, durmam com eles no pensamento, mas… leiam livros.

Um comentário:

Dora Pinto disse...

"Morre lentamente quem não viaja, quem não lê, quem não ouve música, quem destrói o seu amor próprio,quem não se deixa ajudar.
Morre lentamente quem se transforma escravo do hábito, repetindo todos os dias o mesmo trajecto, quem não muda as marcas no supermercado, não arrisca vestir uma cor nova, não conversa com quem não conhece.
Morre lentamente quem evita uma paixão, quem prefere o "preto no branco" e os "pontos nos is" a um turbilhão de emoções indomáveis, justamente as que resgatam brilho nos olhos, sorrisos e soluços, coração aos tropeços, sentimentos.
Morre lentamente quem não vira a mesa quando está infeliz no trabalho, quem não arrisca o certo pelo incerto atrás de um sonho, quem não se permite, uma vez na vida, fugir dos conselhos sensatos.
Morre lentamente quem passa os dias queixando-se da má sorte ou da Chuva Incessante, desistindo de um projecto antes de iniciá-lo, não perguntando sobre um assunto que desconhece e não respondendo quando lhe indagam o que sabe.
Evitemos a morte em doses suaves, recordando sempre que
estar vivo exige um esforço muito maior do que o simples acto de respirar.
Estejamos vivos, então!"

Pablo Neruda