29 dezembro 2008
23 dezembro 2008
Conto de Natal
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17 dezembro 2008
Os óculos
Todos os dias, passavam as mesmas pessoas que lhe acenavam. Santiago retribuía com um sorriso escondido pela sua densa barba.
Seus amigos eram os pombos que pousavam a seu lado e que lhe contavam histórias. A estátua do escritor era sua confidente.
“Grande homem, escreveu aqui e foi lido lá fora. Se um dia me dessem uns óculos, eu leria todos os livros dele. Tenho tempo, todo o tempo.”
Vagueava pela praça, contava os pombos pelos dedos. Dava-lhes nomes.
Corrula era o pombo mais forte e mais belo. Parece que segredava com Santiago pela forma como se lhe aninhava junto ao ombro.
Certo dia, o Sr. Norberto, morador na grande casa amarela da praça e que conhecia Santiago desde a juventude, ouviu-o prometer ao escritor da estátua que um dia leria todos os seus livros, bastava, ter ele, uns óculos.
Na manhã de sábado, quando Sr. Norberto passou por Santiago, ofereceu-lhe uns óculos e um livro do “homem de bronze”. Santiago todo boas maneiras – pobre mas educado – agradeceu com mil vénias.
A partir daí o mundo seria diferente.
Santiago folheou o livro cheio de contente. Virava e revirava cada página como se de uma pena se tratasse.
Sr. Norberto, de volta a casa, viu Santiago a passear nas últimas páginas. No final do dia, já havia folheado todo o livro.
Semanas se passaram e, apenas um hábito tinha mudado, Santiago já não passava as suas tardes a ouvir as histórias dos pombos. Agora era ele que as contava.
No final de cada livro, Santiago, levantava o mesmo à passagem do Sr. Norberto. No dia seguinte outro livro chegaria.
Até que o Sr. Norberto pergunta a Santiago:
– Gostaste do livro que acabaste de ler ontem? Foi o que mais gostei de ler.
Santiago respondeu:
– Os meus pombos gostaram, o Corrula até chamou os pombos da outra praça para virem ouvir as histórias.
– Mas… - o Sr. Norberto ia começar a falar quando foi interrompido por Santiago.
– É verdade Sr. Norberto, os óculos ajudam-me a contar melhor as histórias, os meus pombos pensam que sei ler e acreditam que as histórias são do homem da estátua.
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07 dezembro 2008
A palavra
Palavras para quê?
Uma imagem vale mais que mil palavras, mas conseguirá uma imagem traduzir as mil palavras de um escritor?
Poderá um recurso de estilo caber numa imagem?
Não, disso não me convenço.
Terá uma imagem, poesia?
Será um fotógrafo capaz de descrever duas páginas de Eça?
E o som, poderá a melhor orquestra ler as notas de Camilo?
Palavras curam, palavras magoam, palavras matam… mas as palavras não se vêem…
O melhor que me podem dar… a sua palavra.
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03 dezembro 2008
11 novembro 2008
Personagem: mendigo.
Moldo as pessoas às necessidades que tenho, para que façam parte das minhas histórias.
Ainda ontem um mendigo me sorriu.
Todos os dias, à mesma hora, da mesma forma, no mesmo local onde estou habitualmente, as minhas personagens chegam. Alguns olham-me, outros ignoram-me. O mendigo não. O mendigo faz mais do que isso.
Todos os dias ele aproxima-se, estende-me a mão e chama-me um nome que não tenho.
Vem sempre com cara de quem não é feliz, de quem está zangado com o mundo. É a personagem que não terá, ou não teve até hoje, destaque nas minhas histórias.
Mas ontem, ontem foi diferente. Ontem o mendigo fez mais do que a rotina.
Chegou, estendeu-me a mão e, quando olhei para ele, sorriu e disse o meu nome.
Ontem senti uma personagem vir até mim, o narrador.
Quem sou eu nesta história?
Será que também eu serei uma personagem na vida dos outros contadores de histórias?
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24 outubro 2008
O homem que não se podia mexer
As borboletas têm vida curta e isso era a sua preocupação.
O que faria? Com quem conversaria depois da borboleta o deixar?
Ao sol, na janela, a contar as ondas.
Sonhava poder um dia, levantar-se daquela cadeira e voar por cima do mar. A sua cadeira tinha rodas mas não andava mais do que desde a sua cama até à janela.
Tal como a sua cadeira, o homem também não se movimentava muito, apenas o pensamento era ágil.
Os olhos penetrados no azul marinho, só se desviavam quando a borboleta pousava na sua mão.
Pela manhã, a vida daquela borboleta dava alento ao homem.
“Sabes, hoje sonhei que fui correr na praia. Aquela areia ainda é tão fina como há trinta anos. A espuma é fresca. As ondas beijaram-me os pés. Depois de muitos metros a correr, mergulhei no mar, senti aquela fresca sensação em todo o meu corpo. Depois dormi deitado. Os meus lençóis já eram feitos de areia. Sabes, senti-me livre.
O melhor de tudo, foi quando voei. Sim, eu voei!!! Estava deitado na areia e pensei ser como tu. Então levantei-me, desci até ao mar e, antes que mais uma onda me molhasse, eu voei, fui livre.”
A borboleta abanou as suas finas asas, mexeu-se mais um pouco e voou. Pairou sob a sua face como se de uma despedida se tratasse e foi embora.
O homem tinha sonhado, a borboleta não voltou a aparecer, ele não mais acordou, apenas voou por cima do mar.
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23 outubro 2008
Podes vir, quero conhecer-te
Retirei-me cedo,
Estou cansado e o corpo não me aguenta.
Deito o pensamento sob a almofada.
Às voltas com as coisas que quero fazer,
Por mais que queria, não consigo dormir.
Tenho muitas expectativas para o dia de amanhã.
Como será? O que conseguirei fazer?
Não quero falhar no passo que vou dar.
A manhã ainda está longe,
Mas quero ver a luz o mais rápido possível.
Quero acordar cheio de energia.
Quero ver o mundo.
Como estará o mundo lá fora?
Levanto-me, vou à janela,
Tudo é escuro.
Mais duas horas passam
E eu ainda sem que o sono me tome.
Ânsia, vontade…
O que serás amanhã?
Hoje ainda não te conheço.
Podes vir, estarei sempre aqui.
Hoje não vejo.
Hoje, tudo é incerto.
Hoje, tudo é escuro.
Hoje estou cego de ti.
Mas podes vir, quero conhecer-te.
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18 outubro 2008
15 outubro 2008
Os três dias de um homem…
Ontem
Eu já era, antes de ser
Antes de ser um ser.
Fui homem antes de ser criança
Fui uma vida a nascer, antes mesmo de viver.
Fui embrião em constante crescimento,
Fui algo que não sabia que era.
Hoje
Sou aquilo que me vêem ser
Sou hoje, o que me fiz, homem.
Sou bola de sabão a passear entre agulhas,
Sou o sonho de um ser, sou a vontade de viver.
Sou o orgulho de mim,
Produto da minha matéria.
Amanhã
Serei barco em ondas de mar alto,
Serei idóneo de ser eu.
Serei porto de alguém,
Irei emergir para o mais alto de mim.
Vou descansar e ler um livro,
Serei caminho traçado ainda sem um fim.
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14 outubro 2008
09 outubro 2008
05 outubro 2008
02 outubro 2008
30 setembro 2008
29 setembro 2008
24 setembro 2008
Quero tocar-te, Senhora!
Não sei como o vou fazer pois não consigo desligar-me de mim, nem deixar o que me faz tocar-te mas vou amar só o teu espírito.
Não me vês, não me tocas, não me sentes nem que me coloque defronte de ti.
Teu corpo é belo, vou perder-me.
Tua voz é sensual, vou inebriar-me.
Teu olhar é profundo, vou sonhar.
Não quero ter-te, quero chegar a ti.
Como posso alcançar-te, senhora?
Será pelo espírito? Será pelo olhar?
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23 setembro 2008
Amanhã
O amanhã não pode acabar
Porque o amanhã, amanhã, será hoje
O Hoje, amanhã, será ontem
O Ontem, já foi amanhã, no dia de anteontem.
O amanhã é futuro.
No futuro não posso mexer.
O amanhã não posso alcançar, tal como ele é
Porque quando o for, deixará de o ser.
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21 setembro 2008
20 setembro 2008
Os vícios de um homem
Dedicou-se ao cinema e ficou cego em três tempos
Começou a fazer esculturas e ficou tetraplégico
Então o homem declamou poesia, mas nunca soube se era aplaudido…
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18 setembro 2008
A lua
Hoje, à meia-noite, vaguearei contigo pelas ruas da minha terra.
Saio de casa no fim de jantar. Percebo que me esperas ao virar para sul. Olho-te com agrado pois iluminas os meus passos. Passo pela igreja e os sinos cumprimentam-me doze vezes, desço para o museu, lá a rua tem cheiro a maresia.
Paro e vejo que me acompanhas. Dás-me um sinal da tua companhia quando vejo a sombra de um maltês, que agora é pardo, e que – qual artista de circo – viaja por um muro.
Desço à praça onde tudo está monumental. Moderna, é certo, mas com o espírito nobre. A luz quase te absorve e, por isso, parto de novo à tua companhia.
Na rua à esquerda, voltas. As casas baixas aproximam-te de mim. Volto a mudar de rua, esta tem nome de herói da terra.
No final da rua, sou vértice de um trilátero: eu, tu e o mar…
Hoje, o mar, colocou o perfume de gala, tu o vestido de noite e eu bebo o licor da vossa companhia.
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17 setembro 2008
Perguntas e respostas
… porque não sou feliz se estou vivo,
… porque baixo o ânimo quando devo estar contente,
… porque não vou em frente se tenho caminho livre,
… porque não passo este obstáculo como os outros,
… porque não faço ouvidos moucos a este silêncio,
Respondo: será que ainda saberei escrever para ti…
… a minha viva completa-se com outras,
… venceram-me pelo cansaço,
… há uma parede transparente aos olhos dos outros mas que eu vejo,
… ainda estou a construir-me para passar melhor,
… este engenhoso silêncio sabe como me ensurdecer
E eu pergunto-te:
Porque não me vês mesmo quando me olhas?
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16 setembro 2008
O 13º cego
Morava no segundo andar da pousada.
Sabia de cor quantas escadas tinha de subir para alcançar o segundo piso.
No corredor, contava os passos antes de entrar na décima quarta porta à esquerda – o seu quarto.
“Que sorte, detesto o treze!”
Certo dia, ao décimo terceiro passo, um barulho enorme na rua, perdeu-se a contar.
Confiando nos passos que havia dado, continuou e acabou por entrar...
Aí VIU o outro lado da rua,
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15 setembro 2008
Era uma vez um homem…
Não pedia porque tinha vergonha. Simplesmente vagueava por entre as imensas esplanadas junto à praia.
O seu leito era um vão de escada por detrás de um restaurante.
Tinha um ritual: todos os dias ia até à escarpa junto do farol para pôr fim à vida.
Todos os dias, dizia para si:
“Hoje não é um bom dia, mas amanhã, termino este martírio.”
No dia seguinte era a mesma coisa…
Uma escarpa com cinquenta metros seria um fim rápido mas faltava-lhe coragem para o passo final.
Assim foi durante anos, até que, um dia, partiu decidido. O sol estava quase entre lençóis quando o homem se aproximou da escarpa. Hoje poria fim ao martírio que, para ele, era a vida.
…
O mar tinha subido, já não havia escarpa, o homem não morreu…
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14 setembro 2008
escadas
Escadas lentas que subo para crescer
Descida escura que não quero alcançar
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13 setembro 2008
Do pajem para Sua Majestade
Tendes poesia em vosso olhar.
Meu fascínio existe por ver-vos vestida de beleza.
Vestis estrelas com as quais quero viajar.
Senhora, meu atrevimento é dizer-vos estas minhas humildes palavras tão cruas e pobres, assim, desta forma. Mas sinto tão rico sentimento que posso dizer-vos que não passarei fome. Estarei sempre alimentado deste amor que não posso viver. Cada vez que vos vejo, é como se me satisfizésseis de um jejum insaciável que vivo na vossa ausência.
Novo sou para lutar em grandes frentes de batalha mas afirmo que vos acompanharei em todas as vossas diligências.
Não sei se alguma vez lereis estes meus devaneios sentindo o que sinto quando os escrevo mas, se vossos olhos reais passarem leves sobre minhas pobres linhas de amor, serei nobre desde então.
Sonho com vosso amor, Senhora.
Sonho poder um dia, receber um beijo “real”...
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12 setembro 2008
O beijo
. Início da descoberta
. Descoberta - primeira aventura
. Primeiro contacto
. Suspeita
. Diligências
. Viragem na investigação
. Finalmente as cartas
. A certeza e a dúvida
. A surpresa
. O beijo
Não é um conto, não é um romance, não é uma novela...
O beijo é uma só experiência na escrita.
(c) Auguste Rodin
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Capítulo XI - O beijo
- É o que sempre quis. Quero tirar um curso, quero ser livre e voar. Quero sair de lá formado. Agora não há guerra e daqui por uns tempos estarei de volta para lhe agradecer tudo o que fizeram por mim.
D. Joaquim, orgulhoso de quem tinha ajudado a criar, deseja-lhe boa sorte. D. Teresa abre-lhe a porta para sempre que quiser voltar.
Na manhã das despedidas, Rodrigo toma o pequeno-almoço com Marília sentada à mesa – coisa rara.
No final do pequeno-almoço, com a sua mochila à porta da cozinha, despede-se dos Senhores, dos empregados e também amigos da quinta, da velhinha Dolores que tinha sido convidada para se despedir de Rodrigo.
Era um filho de quem todos gostavam que agora partia.
Não ia para a guerra mas iria deixá-los por alguns tempos e as saudades já apertavam.
Luciana deixou-se ficar para último e quando todos esperavam ver a despedida dos jovens, ela profere:
“Eu vou contigo até à estrada”.
Descem o jardim, passam o lago e Luciana dá a mão a Rodrigo.
Sem olharem um no outro, continuam até à estrada. Caminham juntos em silêncio sem que algum deles interrompesse o silêncio dos seus passos a pisarem as folhas caídas das árvores…
Eis que Rodrigo se enche de coragem e:
- Nem sabes o que me custa abraçar um sonho deixando outro por realizar.
Luciana acalma-o:
- Esperarei por ti.
E…
Solta-se O beijo…

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11 setembro 2008
Capítulo X - A surpresa
Rodrigo, sem saber da descoberta de Luciana age normalmente, isto é, tentando somente demonstrar o seu amor por olhar expressivo.
Sabia que, no fundo, ela sentiria o seu olhar como prova de tanto afecto que ele tinha por ela.
Rodrigo havia recebido uma carta no dia anterior e queria que Luciana fosse a primeira a saber da novidade.
Era um sonho que tinha desde pequeno e que agora se tinha concretizado. Marília tinha perguntado a Rodrigo o propósito de tanta alegria mas este tinha feito suspense.
Tal como Luciana tinha ficado com a sua descoberta, Rodrigo também sentia uma alegria amarga com esta notícia.
Podia finalmente seguir algo que sempre quis mas isto afastaria fisicamente o jovem da sua casa e, principalmente de alguém que sempre admirou, que sempre ambicionou beijar.
Luciana decide então provocar a conversa:
- Tens algo para me dizer, Rodrigo?
- Sim. Como sabes?
- Pareces com vontade disso mas falta-te algo.
Marília percebe o clima entre os jovens e sai da cozinha sem que estes percebam.
Rodrigo, aproveitando a deixa, toma coragem e diz:
- Há algo que sempre quis que agora se pode concretizar, no entanto, tenho algum receio em fazê-lo.
Luciana fica com as bochechas em rubro por pensar que aquilo que tanto queria lhe ia acontecer.
- Alistei-me na aviação e recebi ontem a aceitação da minha candidatura. Se quiser fazer parte, poderei concretizar os meus sonhos: voar, licenciar-me, ter o céu mais perto… Mas há mais…
Luciana fica sem resposta e sai da cozinha com o maior nó da que alguma vez sentiu sem deixar que o jovem pudesse então dizer-lhe o que não tinha tido coragem até então.
Rodrigo fica perplexo.
“O que disse eu? Não ficou feliz por mim…”
Rodrigo estava agora triste por não perceber a razão de ter ficado só, a razão de Luciana não ter ficado feliz e por não ter oportunidade de dizer a Luciana o quanto gostava dela.
Luciana chorava junto ao lago enquanto Marília se aproxima de Rodrigo.
- Que lhe disseste, Rodrigo?
- Que fui aceite para me alistar em aviação e parto amanhã. Só disse à menina Luciana que tinha sido aceite e ela saiu disparada.
Marília chora de alegria por Rodrigo:
- Sempre o quiseste mas não pensei que fosse tão rápido. Estás crescido e não quero perder-te mas agora és mais do que o meu menino.
Por fim, Marília serve-se da conversa para perguntar:
- Já lhe disseste o quanto gostas dela?
Rodrigo fica rubro e admirado com a afirmação de Marília mas como sabe que ela o conhece melhor do que ninguém, simplesmente diz:
- A menina não me deu tempo. Será que está chateada comigo?
- Seu tonto, a menina gosta mais de ti do que tu imaginas.
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10 setembro 2008
Capítulo IX - A certeza e a dúvida
“É trovadoresca!”
Para Luciana, o homem era jovem e admirava alguém que colocava acima de si, pelo menos em admiração.
Apontava agora, na sua lista, os indícios que poderia levar até ao jovem escritor.
Já pensava escrever uma história sobre este amor quando se depara com um nome capaz de ser o autor dos escritos do celeiro: Rodrigo.
“Rodrigo está apaixonado! É isso, Rodrigo está apaixonado. O tempo que passa a escrever no seu bloco quando está junto ao lado…”
Para Luciana este era um motivo tanto feliz como triste.
Feliz porque tinha cada vez mais certezas em relação ao autor das cartas.
Triste porque Rodrigo sempre tinha sido o jovem com quem gostava de namorar e agora ele estava apaixonado por uma mulher mais velha.
Se ele gosta de uma mulher mais velha, não sou eu com certeza – pensa a jovem. Mas quem será?
Um pouco desanimada por saber que, afinal, tinha descoberto o que não queria, Luciana vê agora a necessidade de descobrir a destinatária das cartas.
“Rodrigo é um jovem correcto, aplicado e educado. Marília sempre lhe passou os melhores valores. A vida dele sempre foi conseguir evoluir, sempre quis ser correcto e demonstra-o todos os dias. Porque se terá deixado levar por uma admiração amorosa por alguém mais velho?” – Escreve Luciana no seu caderno como desenvolvimento da “tese” que escrevia no estudo do caso e que mostrava um pouco de ciúme na sua questão.
Rodrigo conversava com Luciana como se de uma irmã se tratasse. Davam-se bem. Luciana gostava de Rodrigo mais do que ele pode imaginar. Aliás, mesmo que Rodrigo nunca tenho ouvido da boca dela mais do que um “sinto um carinho grande por ti”, Rodrigo sentia que Luciana só não correspondia fisicamente. Contudo, para Rodrigo isto era mais uma vontade do que propriamente uma crença.
Luciana admirava a correcção no viver de Rodrigo mas pensava que ele não gostaria assim tanto dela. Agora com as cartas tinha a certeza que não era dela que ele gostava.
Seria assim?
Numa outra carta, Luciana tinha lido que o autor respeitaria sempre a vontade de sua amada pois, alturas houve, em que Rodrigo teve de resistir a um impulso para beijar a “sua senhora” e este não o fez porque ela tinha dito:
“Aqui não.”
Luciana, começa a pensar no dia em que também ela teve de resistir à sua vontade de beijar Rodrigo mas ele estava na cave da casa a arrumar uns livros de D. Joaquim.
Luciana lembra-se que também ela tinha dito a Rodrigo que “ali não” pois queria que o momento fosse mais especial.
Então a jovem cora de pensar que gostaria de ter sido aquele o episódio relatado numa das cartas.
Sim, era a vontade dela.
Mas, se sou eu, porque me trata por senhora?
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09 setembro 2008
Capítulo VIII - Finalmente as cartas
Desce até ao lago onde havia deixado a lanterna para ir ao celeiro. Acende-a após ter olhado à sua volta. Ninguém poderia saber que andava atrás das cartas.
Pé ante pé até ao celeiro mas sempre olhando com muita atenção para tudo o que pudesse mexer.
A dois passos de entrar, um barulho a estalar atrás do celeiro. Parou por instantes. Com medo, não sabia se devia fugir ou se havia de fingir que passeava tal como tinha dito aos seus pais.
Olhou para trás e viu Marília na porta da cozinha.
“Estará ela a observar-me?”
Não, Marília tinha vindo dar de comer a Pintas, o Dálmata da quinta.
Ainda gelada pelo susto, Luciana permanecia imóvel. Disfarça um pouco vagueando em frente ao celeiro de forma a perceber se havia alguém a observá-la ou se seria somente um barulho normal do bosque que se estendia depois do celeiro.
Não, não havia ninguém.
Tira a chave do celeiro do bolso e abre rapidamente a porta não sem antes olhar de novo em volta.
Entra no celeiro e corre até à janela.
Tinha sido só o susto e o medo de uma jovem que estava sozinha no meio da escuridão.
Dá uma volta sobre si para iluminar todo o celeiro.
“Porque te meteste nisto, Luciana?” – diz a jovem para si.
Vai até ao “local do tesouro” – como já lhe chamava – e parte decidida para a leitura.
Desata o cordel que envolve um volume de cartas e começa a ler.
Na carta que se encontra por cima, o último escrito, lê uma declaração de amor:
“Senhora, meu atrevimento é dizer-vos estas minhas humildes palavras tão cruas e pobres, assim, desta forma. Mas sinto tão rico sentimento que posso dizer-vos que não passarei fome. Estarei sempre alimentado deste amor que não posso viver. Cada vez que vos vejo, é como se me satisfizésseis de um jejum insaciável que vivo na vossa ausência. (…)”
Será um homem que ama uma mulher inalcançável. Trata-a por senhora, será mais velha? Será de estrato superior? Será alguém que ele não poderá ter como sua amada, certamente.
De uma coisa ficou certa, era um homem que mantinha um amor platónico por uma mulher inalcançável, aos seus olhos.
Quem será ele?
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08 setembro 2008
Capítulo VII - Viragem na investigação
Luciana decide investir noutro método. Começa a arranjar maneira de entrar no celeiro sem ser vista para poder ler algumas cartas.
Como uma jovem metódica e calculista, traça um plano de investida. Começa por arranjar uma lanterna para poder ir ao “local do tesouro” pela noitinha.
Estuda a melhor forma de ir sem ser vista. Não podia levantar suspeitas nem podia ser vista no celeiro pois, se fosse descoberta pelo autor das cartas, poderia perder todas as hipóteses de chegar até o mesmo.
“Não pode ser durante o dia, pois qualquer um pode lá entrar e assim serei descoberta”, “Se for de manhã bem cedinho, pode coincidir com a altura em que são guardadas ais cartas”, “Terá de ser de noite”.
Apesar de arisca, tinha algum receio de se aventurar se fosse muito tarde pois, no celeiro, não há luz e isto assustava-a.
“No final do jantar, dou uma volta pelo jardim e procuro chegar até às cartas”
Ao jantar, D. Joaquim nota uma certa inquietação na jovem e brinca com o suposto nervosismo da filha.
- Algo te preocupa, Luciana? O que te atormenta? Posso ajudar?
- Não, meu pai. Estou só um pouco ansiosa, deve ser deste calor que passa nesta altura do ano – responde Luciana.
Agora tinha a deixa certa para poder ir passear ao jardim.
- Vou dar uma volta no final do jantar para ver se apanho um pouco de ar. Diz a jovem.
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04 setembro 2008
Capítulo VI - Diligências
Antes mesmo de Marília preparar o pequeno-almoço – o que era bastante difícil – Luciana estava bem acordada a ver novas movimentações.
Marília andava nas nuvens, será por causa do seu amor – pensava Luciana.
Talvez antes da refeição matinal, ela esconda os segredos que escreve dentro do celeiro – pensava a jovem.
Marília surge no jardim com um cesto no braço. Eis que Luciana se dispôs a escrever no seu caderno de apontamentos, qual detective privada.
Cada passo que Marília dava, era seguido por um olhar furtivo do alto da janela. Muitas ideias pairavam na mente de Luciana. As teorias e os possíveis amores estavam a ser apontados numa lista para serem estudados mais tarde.
Convencida que Marília era autora de tal tesouro escondido, só faltava saber quem era o destinatário e confirmá-lo.
Quando acaba a lista de possíveis amores de Marília, levanta o olhar do seu bloco de notas e repara nesta a apanhar amoras para o pequeno-almoço.
“Não posso crer que não é desta que descubro” – pensou a jovem.
Desce até à sala e fica a observar o celeiro, qual predador à espera da presa.
Entretanto, começa a eliminar alguns dos nomes que tinha numa outra lista de possíveis escritores de tais cartas.
Carlos não seria. Era um homem do campo e não sabia ler nem escrever, foi para a lista por ser um dos que entrava todos os dias no celeiro.
Deolinda, sua esposa e também trabalhadora da quinta, apesar de saber ler e escrever, tinha deixado de entrar no celeiro por razão daquele acidente que teve com a ceifeira que quase lhe tirava a vida. Esteve na lista por ser uma animadora nos serões quentes onde expunha os seus pensamentos como se fosse uma declamadora de poemas. Como escrevia bem talvez pudesse ser, mas não era.
O jovem Ricardo que estava na quinta há cerca de dois anos, também tinha figurado na lista, mas o seu recente romance com Raquel, a filha de uns vizinhos da quinta, tinha feito com que Luciana o eliminasse da lista.
Vânia, a empregada de casa, era agora a nova pessoa a investigar.
Era uma jovem muito bonita que estava na quinta há cinco anos. Tinha vindo de longe, dos arredores de Paris, onde vivia com seus pais. Filha de uma família muito pobre, veio à procura de uma oportunidade junto da avó, a velhinha Dolores que tinha o dom da fazer a melhor compota de mirtilo de que há memória.
Vânia era tímida e raramente saía de casa. Tratava dos quartos e da roupa como ninguém. Tudo ficava impecável à sua passagem. Pouco falava, mesmo com os outros empregados. Tinha sofrido muito em nova e havia confessado a Marília ter tido muita sorte em ter entrado naquela casa.
Nunca se lhe tinha conhecido um amigo ou um namorado, a sua confidente era Marília. Como só falava francês quando chegou a casa de D. Joaquim e D. Teresa, tinha-se reservado aos seus pensamentos. Apesar disso, era muito educada e todos gostavam dela.
Pensando na necessidade de afecto que Luciana dizia que todos temos, seria Vânia a autora das cartas. Estaria ali a libertação de tanto silêncio da petite fille. Estaria ela a exteriorizar todo o sentimento retido? Estaria ela apaixonado por algum jovem da aldeia que lhe havia indicado o cupido numa ida à missa ao Domingo?
“SIM, talvez seja Vânia” – sussurrou Luciana como se de um eureka se tratasse.
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10 julho 2008
Capítulo V - Suspeita
Ouvia com muita atenção as vozes de quem a rodeava na quinta a fim de tentar recolher alguma passagem, alguma semelhança de discurso ou alguma frase já lida numa daquelas cartas.
Tudo lhe parecia familiar e, ao mesmo tempo o mistério se tornava cada vez maior.
O que pensar de alguém que ama assim outro alguém?
Luciana tinha duas coisas a descobrir: o autor de tão bela devoção e o destinatário das cartas.
Dias e dias prostrou-se de sentinela, ora na janela do seu quarto, ora junto do lago olhando sempre de soslaio para a porta do celeiro.
Cada visitante suspeito era motivo de alerta. Luciana apontava os movimentos para o celeiro, cada pessoa, cada novo comportamento.
À noite, na sua escrivaninha, estudava meticulosamente cada atitude. Se alguém olhou para trás antes de entrar, poderia querer dizer algo.
Hoje, foi estranho ver Marília entrar no celeiro pé ante pé (a seu ver), e sair do mesmo com ar suspeito.
Luciana, com o dom da mente fértil traçou uma história que poderia fazer sentido. Marília estava há anos naquela casa. Quando Luciana nasceu, já Marília servia na quinta. Será que Marília escrevia os seus amores e desamores e os guardava numa caixinha no sótão do celeiro da quinta?
Marília produzia-se mais para a missa de Domingo, Marília demorava mais tempo no caminho de regresso de ouvir a palavra do Senhor.
Diz-se que os amantes se encontram nas Igrejas para não levantar suspeitas na aldeia.
O pensamento arquitectado por Luciana levaria a pensar que Marília tinha, agora, encontrado um amor e como não poderia corresponder ou ser correspondida, expunha os seus sentimentos num caderno de Cupido.
Luciana, jovem de imaginação fértil. Afinal, também já tinha publicado as suas histórias.
Para este, tudo faria sentido.
Marília tinha uma paixão.
Novo passo da investigação: confirmar a autoria das cartas com mais um comportamento da Marília.
Seguidamente, Luciana anota, no seu bloco de detective:
Etapa seguinte: descobrir o destinatário de tais cartas de amor.
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23 junho 2008
Capítulo IV - Primeiro contacto
“Que poderá estar ali escondido? Talvez não tenha nada. Pode ser que até só esteja uma simples tábua levantada. Mas, se assim for porque me suscita tanto interesse?”
Sim, se dizem que as mulheres têm um sexto sentido, parece que Luciana já o tinha adquirido. Muito pouco lhe escapa, é inteligente e perspicaz.
Entre seus passos leves e pensamentos fugazes, chega ao celeiro e, antes de entrar, toca na porta com dois dedos empurrando-a.
Pé ante pé vai fazendo slalon entre as ferramentas que mantinham a quinta. Ao avistar o local da misteriosa tábua levantada, hesita.
Primeiro observa-a durante minutos…
Seguidamente, não temendo, investe para a levantar. Sopra para tirar o pó e os restos de feno que dormiam sob a mesma e levanta-a.
Um maço de papeis atados com cordel!!!
- O que é isto? – diz Luciana perguntando aos seus botões.
Mesmo sabendo que não devia cobiçar as coisas alheias, a sua jovem curiosidade foi mais forte do que qualquer lembrança relativa aos ensinamentos de consciência de Marília.
Num ápice, desata o maço de folhas. Eram folhas soltas de um bloco escritas com letra de esperança de encontrar algo.
Nelas escreviam-se pensamentos e vontades de um qualquer amor platónico.
Não seria por falta de destinatário que estas não tinham sido entregues. Talvez fossem por falta de remetente… não estavam assinadas.
Assim, Luciana teria mais dificuldade em saber de quem elas eram. Talvez não viesse a saber também, para quem seriam.
Falavam de um amor que ela gostaria de sentir. Falavam de uma admiração pura de um ser por outro. Descreviam as coisas de uma forma mais apaixonada mas percebendo que não eram correspondidas.
Queria ler todas mas com receio de ser apanhada pelo autor daquelas cartas, atou-as de novo e voltou a colocá-las no mesmo sítio.
Saiu do celeiro pensativa… Havia ali frases que já havia sentido o seu significado. Parecia que conhecia o aroma de cada uma delas.
Quem poderá admirar assim alguém? Quem não terá coragem de se declarar? Quem terá um admirador assim?...
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25 fevereiro 2008
Capítulo III: Descoberta - primeira aventura
Tudo parecia cenário de filme. A cozinha enorme, onde todos gostavam de acordar com o café e os biscoitos da Marília, de almoçar, lanchar, jantar e conversar.
Marília era o porto de abrigo de D. Teresa, de Luciana e até de D. Joaquim. Este conversava com Marília sobre os seus negócios. Dizia o senhorio que, se Marília tinha tão boas mãos para ingredientes, tão boa visão para governar uma cozinha que alimentava toda a quinta, então seria certamente uma boa conselheira para os negócios.
- Os economistas ludibriam com termos técnicos de macroeconomia, com estudos de mercado que indicam tendências… São uns facciosos, eu bem sei para que bolsos olham eles – dizia com desdém D. Joaquim.
A verdade é que nestes anos de sucesso nos negócios, os seus melhores investimentos foram aconselhados por Marília na sua mais sincera ignorância sobre economia.
Enquanto os senhores não desciam para o pequeno-almoço que gostavam de tomar na cozinha, Luciana deliciava-se. Estava ansiosa com o que tinha de fazer, com o que tinha de procurar.
Marília sentia-o e, entre o café que fazia e os olhares que lançava para Luciana, profere uma pergunta retórica:
- Está muito feliz, menina?...
Luciana sem saber o que dizer em relação ao que procurar, deixa a pergunta no ar com um sorriso como resposta.
Na realidade, Luciana não imaginaria o que poderia encontrar, sentia que havia algo debaixo daquela simples tábua de soalho que lhe suscitava o interesse.
Saiu para o Jardim, ainda com dois biscoitos na mão, e foi descendo até ao lago.
Ainda se sentou por instantes junto ao lago.
Ao ver que a porta da arrecadação já se encontrava aberta, sorriu.
Levanta-se rapidamente e dirige-se para a descoberta do que não sabe o que é.
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24 fevereiro 2008
Capítulo II: Início da descoberta...
Depois da brincadeira das escondidas ter terminado, quando todos se deliciavam com os biscoitos de Marília, Luciana esquivou-se da cozinha e desceu o jardim. Sabia que ali se guardava algo.
Com o sol a descer, a luz já não era muita e, meio a medo, entrou no celeiro. Desviando-se dos utensílios e ferramentas encontrou o pedaço de madeira que guardava um tesouro. Má sorte, tinham deixado uma caixa em cima da tábua solta do soalho. Não tinha força para a levantar e a sua descoberta teria de ser adiada.
À noite, enquanto os senhores jantavam na sala com a menina Luciana, Rodrigo mostrava a Marília mais um texto.
A ternura de mãe que aquelas mãos tinham, tocara nas mãos de Rodrigo.
- Um dia serás escritor.
Rodrigo, contente por tal motivação, mas com consciência da existência de melhores profere uma expressão amena:
- Calma, Marília. Ainda tenho muito a aprender. Vê só a menina Luciana, escreve muito bem. Um dia gostava de ser como ela. Gostava de ver o meu livro exposto na montra da Pirâmide [1].
Rodrigo sabia que, para poder ter um livro escrito, tinha de trabalhar muito, tinha de escrever bem. Para ele, não era uma questão de orgulho mas antes uma questão de qualidade que ele dizia querer atingir.
D. Joaquim queria saber sobre o que ele tanto escrevia.
Por um lado, Rodrigo não tinha muito à-vontade para mostrar a D. Joaquim que gostava assim tanto de Luciana e depois, mesmo que isso não influenciasse, sabia que se fosse intenção de D. Joaquim editar tais textos, a vontade, o dinheiro e os seus conhecimentos encarregavam-se de colocar o livros nas montras de todas as livrarias. No entanto, um livro seu, seria publicado por qualidade e não por satisfação de um capricho.
Rodrigo, que gostava de ler e que escolhia os autores pela qualidade que ouvia falar, queria ser bom na escrita. Dizia ele que as simples linhas que escrevia para Luciana não chegavam para ser um bom escritor. Queria saber contar histórias, queria saber escrever fluentemente, queria conseguir prender os seus leitores aos seus livros e às suas personagens.
[1] Uma pequena livraria que ficava na cidade onde tinha nascido Rodrigo. Não se comparava às do norte do país onde figuravam os melhores escritores. Rodrigo só queria escrever.
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23 fevereiro 2008
Capítulo I: Começando…
Rodrigo estava no jardim como era habitual às cinco da tarde. Escrevia mais um dos textos que dizia serem a voz da sua alma. Era um jovem com um amor pela vida que não era habitual.
Escrevia sobre duas coisas: a busca de algo que nem ele sabia o que era e sobre Luciana, a sua eterna paixão.
Luciana apreciava-o da janela do seu quarto, no terceiro andar. Via-o como a inspiração para os seus escritos, já havia editado um livro: “Memórias de uma infância inglesa”.
Luciana era a filha dos senhorios. Tinha da mesma idade de Rodrigo.
Como Rodrigo era de classe inferior, este admirava-a platonicamente.
Rodrigo era órfão e, desde muito novo, ficou a cargo de Marília, a empregada daquela mansão. Marília foi como uma mãe para ele.
Quando soube do acidente que vitimara os pais de Robrigo, Marília pediu a D. Joaquim e a D. Teresa que o albergassem. Afinal, sempre serviram aquela casa com rectidão.
D. Joaquim, de bom coração, aceitou deixá-lo a cargo de Marília, ajudou sempre na sua educação mas não lhe demonstrava o carinho que interiormente tinha por aquele rapaz.
Rodrigo cumpria com distinção as suas obrigações. Dizia que tinha de agradecer a Marília com boas notas.
De manhã cedo ajudava com os animais da quinta, depois ia para a escola do outro lado do bosque, quando regressava sempre com um apetite de leão – dizia Marília, tinha somente meia hora. Dizia ele que tinha de fazer os trabalhos de casa porque a matéria estava fresca.
Depois voltava para as lides da quinta. Ajudava tudo e todos sempre sem lhe pedirem. Trabalhava com afinco.
Às quatro e meia, religiosamente, ia lanchar. Marília preparava-lhe um repasto que alimentava três pessoas mas Rodrigo, consumia-o.
Aos olhos de Marília, Rodrigo estava ainda a crescer e precisava de repor energias. Para Marília, era ainda menino mas trabalhava como um Homem. Pegava nos utensílios com à-vontade invulgar.
Mas do que ele gostava mesmo, era de escrever. Em pequeno, com imaginação fértil, era dos melhores nas composições. Depois andou alheado da escrita. Com 16 anos, como não tinha forma de se expressar directamente a Luciana, começou a “confessar-se ao papel” como ele referia à sua escrita de amor platónico.
Cinco da tarde e lá estava novamente Rodrigo a escrever. Marília olhava-o com ternura da porta da cozinha. Os seus cadernos ficavam guardados debaixo do soalho do sótão do celeiro. Aquela tabuinha que escondia o seu amor por Luciana.
Seu sonho maior, era poder escrever um livro que demonstrasse o seu afecto por ela. Assim, concretizava a vontade de escrever e exteriorizava o seu sentimento. Mas, para ele, ainda era cedo.
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17 fevereiro 2008
destino
Para onde vou?
Será que te vou encontrar?
Parto de onde sabes que estou,
Só com o desejo de te beijar.
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09 fevereiro 2008
06 fevereiro 2008
100 título (II)
Servirá para escrever palavras soltas que se ligam na minha mente. Por vezes, elas tomam um rumo que me levam a pensar em ti… Outras, são o resultado, de uma lógica de pensares, contigo como juízo principal.
Servirá para desenhar os traços com que se faz uma expressão do teu rosto. Linhas ténues de uma amizade que me tens demonstrado mais claramente.
O lápis é um instrumento tradutor dos meus sentidos para impressão, assim como os meus olhos são os intérpretes daquilo que sinto por ti.
Sei que sabes o que sinto.
Por vezes, penso que fica algo por dizer… Ficas com algo guardado para ti?
Preciso de ti, preciso de te falar, preciso de voltar a tocar na tua mão como outrora o fiz.
Também preciso que me olhes e, principalmente que…
…um dia mostrar-te-ei o que mais preciso…
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03 fevereiro 2008
Desenho um traço do teu olhar…
Sei que percebes o meu olhar. Por isso, desenho abertamente uma expressão que emite um sentimento que nutro por ti.
Quem saberá ler este rascunho?
Desenho ainda não é… nem sei se alguma vez o será.
Para ser um desenho terá de ser assinado, terá de ser confirmado por um desenhador.
Pego no carvão que pode trazer-te à minha companhia se eu conseguir chamar-te a mim neste papel. Começo por tentar fazer uma sombra mas o teu olhar é feito de luz. De seguida toco no carvão para dar forma à expressão que só tu sabes ter.
Lápis, papel… tento colocar o preto no branco mas… como se põe a íris sob um lençol?…
É difícil descrever tal expressividade. Nem Eça conseguiria descrever cada pormenor de sentimento que emites com teus olhos. Por mais páginas que escrevesse, por mais romances que tal artífice da linguagem criasse, não resultaria personagem tão bela nem com tão belo olhar.
Pedir ao melhor desenhador que colocasse no papel aquilo que lanças, seria impor limites à tua visão. O desenho mais belo não teria a beleza daquilo que vejo quando te olho.
Um escultor não transmitiria nem o relevo nem a textura das pérolas que tens na face. Michelângelo poderia passar horas a moldar o que nunca teria a doçura das tuas lágrimas.
Os melhores artistas não conseguiriam criar aquilo que a natureza colocou na tua face – estrelas brilhantes.
Tento eu, neste rascunho de pensamento, esboçar uma forma de dizer que admiro a leveza do teu olhar e a profundidade da tua expressão…
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31 janeiro 2008
Conversa real
Dia de semana, pouca gente em lazer. Esqueço o mundo e aproximo-me mais da maré. Passeio com as minhas tristezas e alegrias. O que fiz, o que quero fazer, sem planos longos, só vontades.
Olhos para trás com orgulho do que consegui. Sem lamechices baratas, também penso em quem perdi. O que ainda tinha por dizer, o que ainda tinha para fazer…
De bom, lembro as recordações que me deixaram.
Vejo, ao fundo, um barco na linha do horizonte. É tão pequeno que não lhe conheço a forma. Sei que vai seguindo o seu rumo e não mais o voltarei a ver, tal como quem me levaram.
Decido tomar um café numa esplanada de um daqueles bares assentes no areal e que todas as cidades à beira mar plantadas têm. Estou só e triste mas quero este momento só para as minhas recordações.
Peço um café que rapidamente tomei.
Enquanto me perco no horizonte, aproxima-se de mim uma criança. Chega-se a mim, olha-me de frente e fica ali sem nada dizer.
Acho estranho. Ainda olhei em volta mas não vi ninguém. O que faz este menino tão pequeno sozinho aqui? – pensei.
- Olá – disse-me – tás triste? Porque tás a chorar?
Ainda tentei uma daquelas mentiras de ocasião: “É por causa do sol”
- Não é nada! Parece que tás triste…
- E tu, que fazes aqui sozinho?
- Vim passear. Moro ali naquele prédio e a minha avó deixou-me vir para a praia, mas não posso sair daqui. Mas queres-me contar o que tens?
O que pode uma criança entender sobre a perda de alguém tão chegado? Como se fala destas coisas com uma criança?
- Como te chamas? Que idade tens? – perguntei eu.
- Sou o David e tenho 7 anos. Estou na segunda classe. Hoje já fiz os TPC e posso brincar mais cedo. Sempre que me porto bem, posso brincar mais e o meu pai fica contente comigo.
Perante tal desenvoltura no discurso, achei o miúdo engraçado. Cara de traquina mas bastante esperto, pareceu-me.
- Então tens de te portar bem sempre!!!
- Eu sei. Agora tenho isso mais em conta. Desde que o meu pai foi morar para outro sítio e eu nunca mais o vi, tento portar-me bem, para que ele fique contente.
Com esta, não contava eu. Que lhe digo? Pergunto-lhe para onde foi? Se está a trabalhar longe?
Por perceber que eu não iria perguntar, continuou:
- Foi há um ano. Eu estava à espera dele à saída da escola. Era sempre ele que me vinha buscar e naquele dia já estava a demorar. Acabou por vir a minha avó. Perguntei-lhe pelo meu pai e ela começou a chorar. Os adultos pensam que nós não percebemos. Mas sabes-me dizer por que razão vocês pensam que nós não percebemos? Quando eu era pequeno (que delícia de expressão numa criança) não percebia muitas coisas mas depois cresci e já entendo muito.
Com tudo isto fiquei sem palavras. Triste pelo David, que perda irreparável. Confuso com tal grandeza de pensamento do miúdo.
- O meu pai morreu num acidente quando me vinha buscar – concluiu.
Não sabia mesmo o que dizer.
- Agora sei que ele está lá no céu a olhar por mim e quer que eu me porte bem. Sabes, desde que ele morreu brinco mais tempo. Como faço tudo bem, posso vir para aqui brincar.
Não sei de onde veio este anjo, mas hoje eu estava a precisar de um amigo crescido como o David para conversar.
- E tu, porque estavas a chorar?
- Também tive um amigo que foi morar para longe. E como sei que ele já não volta, estou triste. Gostava de ter estado com ele para lhe dizer muita coisa.
O David deu-me a melhor lição que eu podia ouvir hoje.
- Não fiques triste. No dia em que o meu pai foi embora eu tinha tirado um Excelente na ficha de matemática e queria ter-lhe dito isso. Como ele não apareceu também fiquei triste. Agora tenho de tirar muitos Excelentes para, quando eu for ter com ele, levar todos comigo. Mas eu desconfio que ele sabe que eu tenho boas notas: “Mesmo quando morrem, as pessoas continuam vivas…”
Obrigado David!
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27 janeiro 2008
Noite escura… dia triste…
Sem jogos de palavras, hoje estou sem vontade.
Começo a escrever sem saber onde vou parar
Estou aqui para registar uma homenagem.
Ontem a noite foi cruel.
Ontem a noite foi escura demais.
O céu ficou pesado, uma estrela apagou-se…
Sei onde ela está,
Sei que será mais uma estrela a guiar-me o caminho…
A noite de ontem levou-me um amigo…
à memória do S…
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24 janeiro 2008
Oxímoro…
És intensa, sei disso porque estou próximo da maior distância de ti .
Vives com ardor… e frieza quando separas o olhar expressivo que tens da atitude que tens de tomar.
Queria poder sair contigo, poder estar livremente numa prisão que é este mundo de liberdades limitadas, contradições de quem vê a mesma coisa. Só assim poderia beijar-te sem medo de me prender e de te comprometer ao pensamento de, a partir de então, me sentir ligado a ti mas sem elos entre nós.
Ah, pudesse eu apertar-te com a força de um leve abraço.
Prosa confusa da esclarecida mente que não tenho.
Sei o que pretendo… finalizar o que não comecei ou começar o que não terá fim. Dizer-te que sou aquela pessoa que te ama, mas talvez diga a palavra ao contrário, se calhar perceberás o que quero dizer quando a vires ao espelho.
Da última vez que me viste no espelho, acenei-te, mas tu não estavas do outro lado.
Dislexia mental, estou errado naquilo que escrevo, mas certo no que vejo, cego estou.
Podia dizer-te simplesmente que te odeio com a palavra “amor”. Seria contraditório pensar assim, mas não o seria se eu agisse de tal forma… Sinto-o da forma mais directa que uma estrada recta feita de curvas e contra-curvas de que é feito o nosso encontro.
Estou certo do que quero dizer sem que tenha de proferir uma palavra.
Escrevo frases no meu caderno que se apagam ao riscar do lápis… digo-as em voz alta e nem eu as consigo ouvir, gravo-as no papel com a tinta mais escura que a neve, azar da minha sorte… o papel é negro luminoso.
Conseguirás ler a minha mente? Ou serei hoje um livro fechado com páginas não impressas, cheio de histórias que não entendes?
Minha maior contradição: nunca me olharei nos olhos, para me poder confrontar…
Dúvidas no ar, certezas que não respiro…
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18 janeiro 2008
Fragmentos
Dia de Outono, a caminhar na língua da maré, passei por ti. Sorriste-me.
Quis olhar-te de novo mas continuei em frente, tremendo de calor.
Queria que a minha vontade controlasse os meus olhos, mas a razão dominou as ordens. Há partes do meu corpo que só vejo com a alma. Outras, vejo-as com os meus olhos. Como serão os meus olhos?
A minha vontade, por exemplo, virou-se, largou-me e seguiu-te.
Largos passos mais à frente, sentei-me na areia fria.
Tive ciúmes da minha vontade. Mandei que os meus olhos se lavassem de raiva.
Por esta altura, a minha vontade já te beijou. Já sentiu os teus lábios.
A minha vontade já está, por agora, mais feliz que o meu corpo… sentado nesta areia fria.
Ainda pensei… trocar o meu corpo com a vontade e roubar-lhe o beijo que lhe deste.
Mas a vontade é mais forte que o corpo. Então proverei o meu corpo de vontade, levantar-me-ei deste frio para te buscar. Seguirei as pegadas que desenhaste.
E, quando te alcançar,
Perguntarei à tua vontade
Se, tua boca, posso beijar…
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16 janeiro 2008
Vou-me embora…
Mas eu quis lá estar.
Quis passear pela calma que o teu olhar me sugere.
Quis ficar tardes inteiras por entre tuas flores.
Saio com leveza para que não percebas que saí do teu jardim.
Se algum dia tomaste atenção à minha presença em teu espaço (sei que sim, não por presunção mas porque o os teus olhos já mo disseram), saio sem querer pisar o mais pequeno canteiro.
Ao sair, deixo-te um cartão na mesa que está junto à janela. Na mesa onde já toquei a tua mão… onde estivemos juntos e os meus olhos beijaram os teus…
Queria ter dito muito mais do que lá está escrito mas, tu bem sabes, que por mais bilhetes eu te deixasse, nenhum deles teria a descrição daquilo que eu queria que a minha presença significasse em teu jardim.
No teu jardim… leio… o teu olhar…
No teu jardim… ouço… a melodia da tua voz…
No teu jardim… sonho… a quimera de te beijar…
No teu jardim… voo… nas asas de um desejo…
Mas agora saio… sem me despedir.
Queria um último beijo mas sei que não o posso ter.
Porque não sabes que saí…
Porque nunca tive um primeiro.
Um dia que me queiras ver, chama-me… serei o teu “Fiel Jardineiro”…
Mas agora… vou-me embora.
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11 janeiro 2008
Vejo-te na natureza
És uma entre muitas e estás no meio da multidão. Contudo, consigo identificar-te claramente.
Posso ter passado por ti imensas vezes sem te dar atenção. Posso até já ter sentido a tua forma.
Mas sempre que quis tocar-te, fugiste-me por entre os dedos.
Consegues sempre desviar-te com mestria.
Tens um aroma suave mas que consigo sentir quando estás perto.
No Verão o teu cheiro aquece, no Inverno é como o perfume da praia, pura maresia.
Quando estou a aproximar-me, só quero afastar-me de ti para poder sonhar com o meu desejo. E quando estamos distantes, recordo a lembrança de te querer.
Os meus dedos não conseguem segurar-te.
Frágil podes parecer mas de força és feita tu.
Medo não tenho mas o que faltará para te tocar…
Grão de areia…
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06 janeiro 2008
Voltei a apaixonar-me…
Voltaste a ficar na minha retina, então ceguei.
Imaginei que o nosso reencontro seria intenso, mas não pensei voltar a sentir que já senti outrora.
Sabes como me falar, sabes como chegar a mim. Eu não tenho essa sorte, não consigo alcançar-te. Não sei se o queres. Não insistirei, digo eu.
Se calhar nestas linhas que escrevo, pensarás que já é uma insistência.
Será assim?
Será que estou só a escrever aquilo que não tenho coragem para te dizer?
Voltei à adolescência.
Não sei escrever, (se é que alguma vez soube) mesmo quando risco carvão sob o papel e até consigo formar as letras do teu nome.
Não sei como olhar para ti, quando me falas.
Não sei como reagir a um elogio que me fazes.
Isto acontece aos adolescentes. Má sorte a minha porque ainda o sou…
Gosto da forma como fazes de conta que duvidas de quem será a destinatária destas linhas. Dá-te um ar, um tanto ou quanto, de indiferença mas sei que o sabes.
Reconhecer-te-ás nas minhas palavras, com certeza, pois o teu nome está naquilo que lês.
Por vezes não tens paciência para estas coisas. Por vezes não estás para perder tempo com coisas de um jovem em busca de algo que nem ele saberá o que é.
Pois é, isto retrata bem aquilo que sou e o que escrevo aqui.
Sou alguém que escreve sobre a procura de um estado (de alma, de espírito, etc.) que está personificado na figura de uma mulher.
Mas…
Aquilo que procuro, não tem corpo… és tu.
Aquilo que procuro, não tem olhar... é o que vejo e não alcanço.
Aquilo que procuro, não tem forma de lá chegar… teus lábios.
Aquilo que procuro, será algo ou alguém? Não sei.
Tem o olhar expressivo da tua íris. É suave como a tua pele que nunca toquei.
O que procuro está personificado no corpo de uma mulher.
Essa mulher, és tu.
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