30 junho 2007

Momento

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Mão quente, mão fria…
Olhos nos olhos.
Estou nervoso, que faço? Pareço um adolescente
Coração numa correria…
As únicas palavras que ouço:
“- Não, não quero que seja assim…”
Nunca esperei um beijo, nunca esperei uma ligação…
Um contacto: olhos nos olhos…

Noite… mistérios da lua.

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A noite é a altura em que as pessoas se transformam.
Na noite há um tirar de máscara em que quase tudo é permitido…
De dia trabalhamos dentro de uma capa, de um estatuto. À noite, saímos da cápsula que nos abriga dos olhares. Os olhares da noite são permitidos. De noite podemos conhecer alguém com um olhar. De dia, se olhamos para alguém na rua, parece pretensioso. Na noite as coisas acontecem a uma velocidade cruzeiro.
De dia a luz permite ver demasiado, à noite conseguimos ver aquilo que queremos.
A noite tem uma duração imprevisível. Pode acabar no início, pode acabar a meia temperatura, pode acabar quente, pode também acabar ao primeiro raio da aurora. Mas a noite também pode ser o começo de algo.
Quando alguém sai para a noite, sai para passar um bom bocado, mas nem sabe o que lhe espera. Durante o dia, saímos de casa sempre com os mesmos objectivos. De dia usamos relógio, à noite é um acessório de moda.
O relógio do dia controla a vida. A noite controla os relógios da vida.
Se dormimos bem – bom dia.
Se dormimos mal – mau dia.
Se passamos uma noite – bom dia, boa noite.

Se por um lado, tiramos a capa do estatuto que temos (ou não), por outro, temos a lua que nos deixa ver ou mostrar aquilo que queremos, pois na noite as pessoas são diferentes. Na noite as pessoas são reais.
Não é no trabalho que conhecemos as pessoas, não é na rua, não é nos transportes… Conhecemos alguém… sem rosto, sem lua, sem máscara… na noite…
Durante a noite os olhos brilham o que não durante o dia.
Conhecemos bem a noite? Pensamos que a dominamos… ela domina-nos de uma forma subtil.
Deixamo-nos levar pela noite… dentro ou fora… quem escolhe?
A lua aclara os traços reais de uma face, mas esconde as máscaras do dia a dia.
A noite, conselheira dos maus dias… Ombro de descanso.
A noite, carregador de baterias… Poço de energias…
Noite, lugar das loucuras. Noite, lugar de várias temperaturas…

28 junho 2007

As cores...

Hoje é véspera de S. Pedro…
Na minha terra, há cor, alegria, música, bairrismo, etc… pela noite dentro…
Gosto de bairrismo, gosto de cor. Não gosto de fanatismo saloio que se vê nestes dias. Também visto as cores do meu bairro, também me alegro com as cores e músicas, também gosto de ver as ruas iluminadas… mas daí até ser fanático vai um longo, muito longo caminho.
As cores que as pessoas seguem têm alguma simbologia, os símbolos que ostentam, também, mas a loucura que lhes ocupa as mentes é algo mais do que gostar. É fanatismo…
As cores estão presentes nas mais diversas conotações… em Portugal o futebol reina enquanto desporto. Há diversos jornais desportivos, em dia de bola, as cores pintam as caras, vestem com rigor o mais crente adepto. No S. Pedro os Bairros arrastam massas, no quotidiano, o verde é esperança, o amarelo – alegria, o vermelho – paixão, o preto – luto, tristeza, o azul – descrição, nobreza…
As cores estão associadas a todo o tipo de ideias…
Gosto de cor, mas também gosto de descrição…
Gosto de tradição, mas também gosto de inovação…
Gosto de paixão, mas não de fanatismo…
As cores alegram, as cores chateiam, as cores elevam o ego, as cores ofuscam, as cores identificam, as cores…
As minhas cores são: preto, branco, azul, vermelho, laranja, castanho, cinzento… são todas as cores, são o aceitar das outras, são o identificar com algumas, são o sal da luz…
O amarelo no céu: ouro sobre azul…
O verde no branco: a esperança no futuro…
O vermelho no branco: uma paixão clara…

27 junho 2007

Por que escrevo…

Uns (poucos) dizem que gostam… Outros dizem que os meus escritos parecem devaneios. Se calhar até o são…
As coisas que me passam por dentro são confusas demais para se manterem em conjunto no meu interior.
É complicado gerir o meu interior. As coisas que me passam pela cabeça são difíceis de expressar. As entrelinhas dos meus escritos são escapes à minha tensão interior e exteriorizam, ou pelo menos tentam, a insatisfação dos meus dias…
Não estou a passar por uma crise existencial, até porque sei bem o caminho que piso e sei o que quero.
A revolta interior tem mais a ver com as notícias que me chegam diariamente. O mundo, as pessoas, os universos paralelos…
Acredito que, no mundo, há dois tipos de universos – o que circula à velocidade da terra, o outro aquele que veicula à vontade de quem nele vive.
Quantas vezes pensámos nas futilidades e nas frases feitas que no mundo, metade dos habitantes forçam o infortúnio da outra metade…, que alguns só andam no mundo por ver os outros andar…
Pois é, também por isso, escrevo os meus devaneios.
Prefiro alhear-me de qualquer um destes universos… Tenho o meu.
Já quase pertenci a um outro universo – o passivo… mas ainda me afirmo neste – no meu.
Hoje passo por uma fase desinteressada do meu ser. Não se trata da falta de objectivos. Trata-se de uma falta parcial de identidade… Acho que a tenho e acredito nela, mas a todo o momento sinto que ma aspiraram (também hoje mo disseram)…
Tenho a minha personalidade, defendo os meus valores, tenho o meu próprio valor… vivo no meu universo, tenho o meu mundo… só quero que me deixem vivê-lo… quero que me deixem gozá-lo…
Os que acreditam em mim, estarão comigo assim como estou com quem acredito…
Os que não acreditam… esses terão um convite para assistir à apresentação dos meus escritos, na primeira fila… eu mesmo os convidarei…

Fim de tarde com o meu avô...

Era novo…, quer dizer, ainda sou mas era mais novo.
Estava na praia e vi o meu avô. Deixei os meus amigos e sentei-me ao lado do meu melhor mestre. Ele ensinou-me o valor que mais defendo hoje.
Ironia ou não, sem saber ler nem escrever ele tinha o que de melhor se passa a um neto: valores. Valores são mais do que ensinar a dizer “por favor” e “obrigado”. Valores são aqueles sentimentos e ideias que defendemos sem pensar em factores ou influências. São o que são – hoje, amanhã, de dia ou de noite.
Esteve ele a ler as ondas do mar. O seu pão, a sua casa, o seu amigo… Com ele conversava. Dele tirava o melhor saber… Aquele olhar, perdido nas ondas que terminavam no horizonte. Mal me viu, sorriu… Que sorriso carinhoso do velho do mar!!!
Velho, o meu avô nunca foi…
Era um homem sem feitos memoráveis. Os que a terra conta com estátuas…
… mas também não tinha defeitos que lhe pudessem apontar. Não conheço quem dele tem algo a apontar…
Tirava a camisa do corpo para dar a um pobre. Dava o que o mar lhe tinha dado a um necessitado, pois a sua família, melhor ou pior, tinha algo para comer…
Admiro-o ainda hoje… O seu olhar… os seus valores, a sua sinceridade.
Um Homem daqueles que todos queria ter por amigo… um Homem…
Ao lado dele, disse-me: “Sabes, neto… amanhã vai estar um dia lindo, o mar disse-me na última onda”.
Nunca pensei que estaria senil… Ele sabia bem o que dizia…
Hoje, sou eu que vejo as respostas que ele me dá através das sétimas…
Pergunto ao meu avô, o mar responde…
A verdade é que aquele fim de tarde ficou gravado na minha memória.
O fim de tarde com o meu avô…

26 junho 2007

Dia cinzento

As sombras são cinzentas, as nuvens… nem brancas nem negras… cinzentas…
Olho em redor mas não há cor. Há uma mistura de luz com ausência dela… cor da cinza…
Não sei se o tempo está a ficar claro, se a ficar escuro…
Hoje estou a sair da bruma… ou parece que estou a entrar nela.
O que faço?
Consulto o diário de bordo… na frente – luz… cinzenta… Nada está claro.
A única certeza? A de que tenho dúvidas.
Se o cinzento existe ou se é uma mistura de branco com negro…
O meu interior está cinzento… a minha estrada é cinzenta… o meu céu… cinzento é…
Que neblina… que nevoeiro… cor de alumínio…
Ironia da frieza do alumínio…
Cinismo da incerteza da cor…
Insatisfação – nem alegria da cor, nem tristeza da escuridão…
Esperança também não… é verde…
Cinzento, hoje… simplesmente cinzento…

23 junho 2007

Silêncio... ruído ensurdecedor

Quando é sentido o vibrar do silêncio, é ensurdecedor o que passa por mim...
Que estranha forma de expressar algo sem som... pois é.
Podia falar da cor mas seria difícil porque também podia dizer que a cor não existe. São só os fragmentos de luz que se reflectem nos objectos. Então o branco serão a mistura de todos os tipos de reflexos e o negro será a ausência de luz.
Que confuso o meu pensamento, será?
Será, talvez a visão mais céptica daquilo que vejo.
Os pólos. Porquê chamar pólos ao Árctico e à Antártida? Se pólos são extremidades e o mundo é oval, porquê chamar pólos?
Com tantas contradições, podia também escrever sobre a paixão.
Porque será que utilizamos esta frase quando sentimos algo de muito forte e bom por outro alguém, quando, na realidade, esta palavra significa sofrimento. Mas afinal, estar apaixonado é mau? E o outro alguém, far-nos-á mal?
Posso falar por mim: não acho que seja assim tão mau estar apaixonado. E o outro alguém a que me refiro neste momento, também não me faz mal. Pelo menos continua a deixar-me sonhar. Com o quê? Nem eu sei. Mas não me incomoda. Não, nem um pouco. Não posso, não devo, nem quero cobrar nada que nunca me foi prometido nem nada que nunca esperei.
Se alguma vez pensei em algo de bom... Sim, pensei e não o posso esconder. Mas o tempo passa, crescemos. Quando temos 12, 13, 14 anos, parece que o mundo acaba se não ficamos com quem queremos. Ainda sonhamos em mudar o mundo. Pensamos que somos iguais aqueles heróis que fazem história e vivem na morada dos imortais. Depois começamos a crescer e a ver o mundo num nível de metro e oitenta (para quem tem essa altura). Não vemos o mundo de cima mas vemos mais coisas.
Se temos um carro baixo, podemos andar muito porque ele é aerodinâmico e tem velocidade característica dos baixinhos, mas se tivermos um carro mais alto, conseguimos ver o carro que vai à frente daquele que vai à nossa frente. Então já somos mais cautelosos e abrandamos quando o somos terceiros e o primeiro abranda, porquê? Porque já o vemos. Começamos a estar mais atentos. Apesar de sabermos conduzir, é melhor abrandar num cruzamento - um louco pode vir distraído.
Depois temos mais responsabilidades e se queremos fugir nos primeiros erros, depois percebemos (os que percebem) que não somos grandes se temos um metro e oitenta ou se temos um carr(g)o alto ou ainda se achamos que não erramos.
Então vem alguém que até pode nem saber ler nem escrever e diz: "Um (Homem) grande não é aquele que não erra, mas antes aquele que assume os seus erros"...
Começamos a ter outra visão. Porque será que depois disto eu posso pensar que aprendemos a "dominar" alguns sentimentos.
Estaremos mais frios?
Porquê se o planeta aquece à velocidade de dois graus por ano?
Porquê, se os "pólos" gelados de um mundo sem extremos, se derretem como um cubo (de duas moléculas de hidrogénio com uma de oxigénio) em cima de um fogão?
Não seremos mesmo mais frios, quando crescemos?
Será que já conseguimos perceber as distâncias que nos separam?
Será que temos receio de não dominarmos por completo aquilo que nos parece dominado pela nossa "frieza"?
Então eu pergunto. Existe frieza? Ou é só a ausência de calor?...

21 junho 2007

Tenho um ritual...

Todos os dias levanto-me, coloco o pé direito no chão em primeiro lugar. Depois das coisas normais que quase toda a gente faz, saio de casa, passeio pela rua, desço os degraus da rua ao lado da minha casa…
Encontro-me com as mesmas pessoas todos os dias… no início da rua X, passo pelo senhor de meia-idade de bicicleta. Mais abaixo, a senhora dos chapéus… todos os dias tem um diferente.
No fim da rua X, os mesmos pequenotes a correr para a escola. Nunca passei por eles mais acima, era sinal que não iam atrasados. Mas as pessoas, as ruas, as árvores… estão todas no mesmo sítio, têm sempre as mesmas cores…
Todos os dias as coisas estão no mesmo lugar…
Gostava que todos os dias fossem diferentes. Gostava que não houvesse rebanhos. Desculpem o mau jeito, mas vivemos numa sociedade de rebanhos.
Sete da manhã acordar, uma hora de transportes, trabalho a correr pois é preciso picar o ponto, meia hora o almoço a correr, novamente o trabalho, sair, transportes… dia completo… no fim do mês: ordenado para casa, carro, dois filhos, almoço fora só ao Domingo (quando dá).
Vida de rebanho.
No final disto, prefiro acordar sem o despertador, sair de casa a horas que o relógio não tem. Trabalho todos os dias num sítio diferente. Não tenho horário de entrar, nem de almoçar nem de sair… Mas saio realizado. Fim do trabalho, não é fim do dia. Passeio até casa, sempre por caminhos diferentes. Todos os dias conheço um novo caminho, todos os dias conheço novas pessoas. Todos os dias vejo as casas de cores diferentes. Todos os dias tenho um ritual… ser diferente… de tudo, de todos… Não é porque quero, se calhar é porque o sou… nem melhor, nem pior… simplesmente diferente.
O meu ritual: ser diferente, do que fui ontem e do que vou ser amanhã…
O meu ritual: ser melhor do que sou hoje… sem pensar no que serei amanhã…

20 junho 2007

Ao contrário...

Estou sentado num banco de jardim… numa praça enorme. Vejo muita gente e não conheço ninguém. Grandes edifícios de um lado… um jardim repleto de verde do meu… crianças a brincar, os avós pacientemente a educá-los… estão na paz que o jornal não conta.
Leio o jornal… diz que o mundo vai mudar de lugar… O que vou fazer? Será que vai mudar de sítio? Irá mudar de posição? Se mudar de sítio quero ir para um sítio bom. Mais perto do sol, mais perto da luz, mais perto de ti.
Se o mundo mudar de lugar pode ser que estejas mais perto.
Se o mundo mudar de posição, o que fazer? O que irá acontecer? Será que as coisas vão ficar ao contrário? Será que o nosso tecto vai ser o chão?
Os rios irão nascer no mar… - esta parte, diz o jornal que quem escreveu, foram “os loucos de Lisboa”…
Vou ler os meus livros ao contrário… Irei ler de trás para a frente? Para que lado viro a página? As histórias não terão finais tristes nem felizes… podem começar de uma dessas formas…
A direita será a esquerda, e a esquerda será a direita… o cimo vai ser em baixo, o céu será a terra… terei os pés assentes onde? O nascente terá o pôr-do-sol e o poente terá o sol de companhia pela aurora… Desceremos as escadas para cima...
E os relógios irão dar voltas de caranguejo? Se for assim, posso recuar no tempo. Posso encontrar-te primeiro.
Vou preparar-me pois o jornal diz que está para breve.
Vou ligar-te, talvez não saibas e tenho de te contar.
Pego no telemóvel, procurei o teu nome para falar contigo mas não o tinha, estou sem números na lista. Ou… espera, não tenho o teu número, não sei o teu nome…
Tenho o jornal na mão… vou procurar-te no jornal… mas as letras já começaram a mudar de sítio…
Só peço que não te mudes… não me coloques ao contrário…

19 junho 2007

O que desejo...


Quase te toquei… senti o teu olhar…
Estou ligado... completamente.
Tenho receio de um impulso. Agora estou só, mas tenho-te comigo.
Apetece-me abraçar-te, quero-te mesmo.
Hoje estou particularmente frágil. Fisicamente – sem força. Mentalmente – ligado a um sentimento muito forte.
Nunca te toquei mas tenho saudades de te ter.
Queria tocar-te, nem que seja no coração.
Queria sentir-te, nem que seja no olhar.
Discurso da procura.
O que quero encontrar?
Não sei o que busco, sei que te encontro em momentos fugazes que me dão alento e que me fazem acreditar que existes.
Não sei se te encontro, não sei se és um sonho, não sei se recebes os meus sinais.
Basta-me uma palavra…
Diz-me se existes da mesma forma que te vejo…

17 junho 2007

Números...

Viajo pelo mundo, sem ninguém a quem ligar… Parei no hotel. A recepcionista perguntou se queria algo, como é da praxe perguntar a um hóspede. Gosto de pessoas que perguntem mas não das que me chateiam com aquele sorriso amarelo.
Estou de passagem mas gostava de levar boa memória.
Subi, o quarto fica no fundo do corredor. A terceira porta à direita. Número 451. Lembrei-me dos livros… Dos que me acompanham em cada viagem que faço. Terei a sorte de encontrar um bom livro neste hotel? Já li os três que trago na mochila. O último com que me encontrei, fazia-me lembrar-te…
O número do meu quarto faz-me pensar se devo ou não entrar…
Estou cansado, quero repousar… mas… este número…
Pensei no último quarto de hotel. Treze, estava na porta. Não hesitei em pensar em… má sorte… mas entrei, passei o corpo por água… Sempre a pensar no treze…
Mais tarde pedi uma bebida… levaram-ma sem demora. Vi nos olhos do empregado que me pediu gorjeta… dou-lhe quando sair – pensei (quando dou uma gorjeta gorda, tratam-me de outra forma), no final dou-lhe…
Aproximei-me da varanda… malte no copo com duas pedras, ventoinha ligada, está calor, abro a porta da varanda… sento-me numa cadeira velha que lá está… Olho para o céu… pintaram o céu…
Que melhor poderia eu desejar para esquecer o treze da porta do quarto… um céu repleto de estrelas. Tento fazer o teu retrato… vejo-te ali… junto àquela constelação…
Consegui esquecer o treze…
Agora 451… faz-me pensar em livros… temperatura…
Estou pensativo, mas vou entrar… será que encontro o teu livro aqui…
Quero ler a tua história, estou curioso…
Viajo por várias razões… procuro-te por todo o lado… fico no hotel à espera que me ligues mas não sabes onde estou… vou à varanda e procuro-te no céu… onde estás? Presa a um número qualquer, talvez…
Em todos os hotéis e lençóis onde durmo, espero ver-te, sentir o teu cheiro… sem números de fantasia… quero ver-te a sério… tocar-te docemente… sou atrevido, quero mais do que olhar-te…
Deixei a mochila ao lado da cama… tomo um duche demorado… não sou capaz de te esquecer…
Antes do jantar, escrevo uma carta… para ti… mais um escrito… tenho alguns guardados na mochila… Não é o diário de viagem… são cartas sem morada de destino, mas são cartas para ti…
Quantas cartas tenho? Perdi a conta. Não as conto pois ficaria preso a mais um número. Iria gostar do número? Iria fazer-me pensar? … Não tenho cabeça para números, gosto mais de palavras… por isso te escrevo…
Há tanto para dizer mas não há palavras ou eu não as sei escolher…

Memória de uma noite…

São quatro da manhã, estou só… Ouço os relógios a pulsarem cada segundo que passa. Que estou a fazer… Vejo a luz do candeeiro sob a mesa. Um papel, um lápis e uma borracha estão em repouso, à espera que se lhes dê vida… O papel - suporte da obra, o lápis - ferramenta… a borracha - algo que quase não é usado. Porquê? – penso. Porque prefiro riscar, é sinal que tive uma ideia, se a apagar poderei não voltar a ela, se a riscar, há sempre a possibilidade de a ela voltar…
Um escrito, à espera de ser começado… Uma ideia abstracta à espera de se materializar para que passe à vida. As ideias, no cinzento, são incolores… as ideias no papel, branco – ganham cor.
Não sou arquitecto de ideias, sou operário. Não sou mentor delas, sou ferramenta. Não sou escritor, sou antes usado pelo lápis para que este comunique com o papel… A borracha, observadora…
Agora, o ponteiro dos minutos correu... saltou dez vezes…
Parei um pouco, o lápis soou um risco pelo papel. Um aviso. Uma ideia que ficou escondida atrás de uma fina parede de carvão… Eu vejo-a mas o lápis preferiu deixá-la ali a repousar… está a amadurecer mais um pouco… De manhã estará fresca.
Não insisto e deixo ficá-la ali… a borracha ainda sentiu que seria levantada daquela calma… Observadora, percebeu que o seu mérito é apagar o que foi mal construído, aquela ideia é só um rascunho.
Continuo em desvario. Não sei o que marca a cadência das palavras no papel: será o ponteiro dos segundos, será a marcha do carvão, será o ritmo das ondas de luz do candeeiro…
Não sei, mas parei um pouco e pensei…
Só tenho relógios digitais nesta sala, não posso ouvir os ponteiros…
Não tenho a luz acesa, já é dia…
Não tenho ideias no meu pensamento, só te tenho a ti…

14 junho 2007

Ando ser ver ninguém...

Onde estou…
Dei um passo, olhei à minha volta… ninguém…
Andei mais um pouco, continuei sem ver ninguém. Que estranho, o mundo não tem ninguém… Onde foi toda a gente? Será que fiquei aqui sozinho?
Se calhar foram a uma festa da qual não vi divulgação. Ou então foram convidados para o aniversário de alguém que não conheço.
Onde estou? Também não sei. Tenho mapa. Procuro no bolso… sem fundo, tenho o bolso cheio de nada.
Fico à espera que alguém apareça para perguntar onde encontro gente. Com aquela esperança que temos quando estamos perdidos no meio de um sítio que pensamos conhecer… Marcamos viagem, temos tudo, o trajecto marcado, não nos vamos perder com certeza. Mas quando viramos onde não devíamos ter virado… Pensamos: não há problema, encontro alguém e pergunto.
Eu continuo sem encontrar gente. Um quarteirão, ninguém, mais outro… espera. Pára!!!
Quem vem daquele lado? Uma folha caída a passear com o vento. Dois amigos.
E eu, onde quero ir? Não sei.
Procuro alguém? Sabes que sim… até acho que sei onde estás.
Estás no aniversário de alguém que não conheço… porque se tivesses numa festa, tinhas-me dito…
Desde que me senti perdido, sem ninguém, já dei… aquele número de passos que ninguém conseguiu contar…
Por onde vim? Não sei, não apareceu ninguém e vagueei…
Procuro-te, procuro alguém…
Só para perguntar… onde fica a rua onde moras?
Dá-me um mapa… uma referência de onde te posso encontrar… ou vem ter comigo…
Vamos juntos e apresentas-me o teu amigo que “faz anos” (diz-se assim)…
Ou então vamos fazer nós a festa sem divulgação.
Celebrar o quê? – perguntas tu…
O ter-te encontrado

13 junho 2007

Tu existes, eu sei...

Hoje não te vi…
Não cruzei o meu olhar com teu. Hoje não senti a luz do teu olhar no meu… Sim, tem luz, eu sinto-a quando nos tocamos pela visão.
Pensava que te encontrava num momento qualquer mesmo que de fugida. Pelo meio de uma estante, pelo meio de um qualquer momento distraído em que nos fosse permitido perder no interior da íris um do outro…
Queria tanto cruzar um olhar… queria ter dito um olá com os meus lábios e ler, pelo menos, um sorriso nos teus, mas não foi possível…
Cada vez é mais difícil, mas sinto, cada vez mais, a vontade de te encontrar.
Onde? Como? A que horas? De que forma? Perguntarás por vezes…
Também não tenho respostas. Mas gostava que as respostas fossem mais fáceis de encontrar do que um momento dentro do calor do teu olhar.
Por vezes, acho que quase me permites um momento de loucura, pelo menos no pensar, no sentido platónico. Já me ouviste dizê-lo… ou já terás sentido.
Comecei mais um escrito a pensar que te iria encontrar quando levantasse o olhar. Mas sabia que não seria possível.
Por que me atrevo a tratar-te assim? Não sei. Se te ofendo, desculpa-me…
Mas não sei o teu nome. Ou sei?
Se te vi um dia? Talvez…
Se quase me perdi? Sim quase, mas respeito-te…

Como posso dizer tudo isto… se nunca te vi, se nunca te encontrei…
Tu existes e isso faz-me sonhar…

12 junho 2007

Eu... livro...

Por vezes sinto-me um livro…
Quando penso naquilo que sou, penso que sou um livro…
Por vezes com histórias. Por vezes passo sentimentos, por vezes faço as pessoas ter vontade de me conhecer, mas reconheço… tenho um título pouco sugestivo. A minha capa até nem aparenta o conteúdo de uma história interessante, mas também sei, sem falsas modéstias, que as linhas que contam a minha história são linhas sentidas…
Há traços ligeiramente desalinhados… mas são os meus.
Que história conto eu? Mistério, alegria ou tristeza. De uma coisa estou certo, conto uma história real. No meio dos outros livros que me rodeiam nesta biblioteca da vida, encontro livros de todos os tipos. Livros com histórias bem engraçadas que não aparentam pela capa que possuem, outros têm uma capa bonita, têm ornamentos nas lombadas e até uma página de rosto engraçada que suscita curiosidade mas… e depois… pouco, muito pouco.
Depois há os difíceis… os livros que eu chamo Lobo Antunes… Aqueles que mostram a sua atitude crónica, mas interessantes, acho. Até têm riqueza (para alguns). Mas são livros rebuscados, de trago duro… Mas até podem ser válidos, não questiono.
Há também os técnicos, cheios de termos e outros esquemas, diagramas, ferramentas…
E eu? Espero que me leiam…
Se fosse uma pessoa, esperava que me lessem o olhar porque acho que o teria expressivo, mas como sou um livro… gostava que percebessem as minhas entrelinhas ou, pelo menos, que as lessem sem questionar a sua existência na minha história, no meu contar…
Se fosse pessoa, seria paciente, mas como sou um livro, dou uma boa margem…
Como livro que sou, posso afirmar que há histórias melhores … mas não posso nem vou fazer nada… já estou escrito, já fui editado… Agora só posso fazer-me um livro aberto para quem me quer ler…

11 junho 2007

Barulho da luz


Barulho da luz…
Porque não cheiro da cor? Ou sabor da água? Tanta coisa podia ser, mas não teria nexo. Mas a luz tem barulho… sim, pode ter. Se prestarmos atenção ouvimos os filamentos por onde passa a luz a emitirem sons, pequenos ruídos que nos fazem perceber que afinal aquilo que nos parece que não tem certas propriedades, até as pode ter…
Por vezes não acreditamos em nós, por vezes são os outros que não acreditam que somos capazes. Então temos duas opções, quanto a mim: mostrarmos a nós mesmos que somos capazes ou mostrarmos aos outros que conseguimos. Prefiro a primeira. Se me apetece ouvir o barulho da luz, então não tenho que provar que o ouço… Ouço-o e pronto. Vou acreditar em mim… Sou o que sou…
Podia também desconfiar que a cor não tem cheiro mas afinal tem… O céu está cinzento, o dia também… existe um cheiro no ar. O cheiro a cinzento. Estamos num campo de rosas vermelhas ou estamos num campo de rosas amarelas. Existem cheiros diferentes… num, o cheiro da paixão. O vermelho cheira a paixão. No outro, o cheiro de alegria…
Afinal a cor tem cheiro…
E a água? Tem sabor?
Claro que sim… porque dizemos que a água sabe bem… será da temperatura. Estamos num dia quente, um copo de água fresca sabe bem… Então, ou a água tem sabor ou é a temperatura que o tem.
Será que nestas linhas provei algo a mim próprio? Ou será que o provei a outro alguém… A mim não preciso de provar, eu acredito em mim… Aos outros… que posso eu fazer?
Vivo por mim e não por outro alguém. Tenho a minha vida, o meu tempo, o meu cheiro, a minha cor, o meu sabor… Também tenho a minha luz e, por vezes, faço barulho com o silêncio das linhas que escrevo…

Hoje sou um grão de areia


Estou no meio de outros tantos grãos de areia numa praia cheia de gente. Também sou uma pessoa no meio de uma multidão. Sou banhado por um mar.
Sou um grão redondo como tantos outros, sou do tamanho de outros tantos iguais. Sou também diferente de todos estes. Não sou mais redondo do que eles, mas também não menos que os demais.
De que cor sou – da cor da pele. Como é possível ser da cor da pele dos humanos? Os humanos têm cores diferentes e os grãos de areia não podem escrever. Eu escrevo.
Então sou um grão de areia diferente. Sou um grão de areia que escreve. Sou um grão de areia com a sorte de saber que sou diferente.
Os grãos de areia também podem ter sorte.
Eu tenho…
Porquê?
Porque sei que existo, porque posso escrever, porque tenho um mar que me banha, porque estou numa praia infinita, cheia.
Mas por que razão estou nesta praia e não estou noutra?
Não sei…
Saberei um dia.
Se um dia pensei poder escrever e hoje escrevo, também um dia saberei porque estou aqui e não noutro lugar.
Então aí serei um grão de areia com conhecimento. O conhecimento da razão de existir…
Sei que sou um grão de areia, logo, existo como tal…
Tenho luz que me ilumina, tenho perfume de mar, tenho cor de humano, tenho forma e escrevo (nem bem, nem mal… antes pelo contrário).
Estou sozinho no meio de uma multidão. Acompanhado por outros tantos…

10 junho 2007

Pedaço de sombra


Serei eu um pedaço de sombra que se tenta descolar de um corpo…
Não sei o que sou, não sei a quem pertenço, não sei onde estou. Só sei que estou assente num conjunto de texturas, de rochas, de coisas das quais não me posso separar. Sou a contraluz de um corpo.
Serei o contrário de luz? Não, não quero ser.
Serei do tamanho do corpo que me cobre a luz? Por vezes sou maior, outras menor…
Quem sou eu afinal?
Crise existencial.
Não sei quem sou. Não sei por onde vou. Não sei qual é o meu caminho, porque não me consigo separar deste corpo. Não sou eu que escolho o caminho que percorro. Porque será?
Será que não tenho voz para fazê-lo? Será que não tenho como enfrentar o corpo que me leva?
Afinal o que sou. Um pedaço de sombra… Não, sou uma sombra completa. Serei? Afinal vou moldar-me. Melhor, alguém me vai moldar…
Sou de onde? Não sei.
Ah, já sei. Sou da China. Ouvi falar das da China. Serei uma sombra chinesa?
Serei eu, um pedaço de contraluz, moldado por um corpo como uma qualquer sombra chinesa?
Não, penso que não.
A que corpo pertenço? Que alma me detém?
Tantas dúvidas e uma certeza – sou um ser sem luz, porque a minha própria sombra é um corpo que me cobre dela.
De dia estou deitado. À noite, junto ao meu corpo.
Estou onde? Sempre atrás do meu corpo.
Mais uma premissa que quero derrubar: Atrás de um grande homem está… uma grande sombra.
Sou uma sombra grande, mas quero ser uma grande sombra, porque uma pequena me disse um dia que eu iria ser…

09 junho 2007

À minha biblioteca...



Livros,
Sons,
Imagens,
Um mar de emoções.
Linhas infinitas de frases...
Ditas, escritas e pensadas...
Um grão de areia, um livro
O pôr-do-sol, uma imagem
As ondas e o bater do mar, o som
A maresia, o prazer de estar
As emoções contidas nesta paisagem
Para todos os sentidos
Todos nós sentimos...
O mundo abraçado nesta casa.

As páginas do mar...
Nas ondas de um livro...

08 junho 2007

Estrutura de um ser



Um ser tem estrutura... que o sustenta. Temos estrutura física (óssea) que nos mantém de pé. Somos capazes de mover objectos, pessoas, etc... A estrutura física faz de nós seres activos numa floresta de outros seres que se mantêm, sim, só isso, mantêm-se. Depois há outras estruturas: a mental, por exemplo. Temos de a manter sã para que a física se aguente. Pois é, que não gosta de manter uma boa estrutura mental.
Somos felizes ou tristes, somos persistentes ou desistentes, somos incansáveis ou facilmente satisfeitos... somos fortes ou destrutíveis, Somos, somos... somos o resultado do estado da nossa estrutura...
Podemos admirar a estrutura de uma casa, a sua arquitectura. Podemos achá-la bonita como qualquer corpo de qualquer homem ou mulher...
Que bonita estrutura, arquitectura... Mas e a sua sustentabilidade... será que resulta bem toda aquela pompa? E a sua circunstância?...
Dúvidas nos podem suscitar a estrutura. Sou feito de estrutura, de reflexos, de braços (fortes ou não) que seguram toda aquela pele de vidro que me protege da chuva mas não dos raios solares (da luz ou da escuridão). Podemos esconder-nos da chuva, podemos não nos molhar, mas com estrutura de vidro (com que os Homens são feitos) ficamos morenos ou brancos.
Já se dizia que uma pele morena, dá a impressão de saúde... uma pele pálida, não. Sou moreno, tenho estrutura, física – 306 ossos - alinhados excepto o externo, uma infinidade de músculos em que o mais saudável e mais abrangente de outras estruturas: físicas, mentais e sentimentais – o coração – o maior cérebro desta minha estrutura...
Uma estrutura, arquitectura, base, suporte, vidro, luz...

07 junho 2007

Se o Abrunhosa fosse bibliotecário...

Estou aqui num canto de uma linha escrita à espera que chegue uma outra sequência de letras a formar uma expressão tua...
Estou aqui, à espera de ler o teu corpo, de sentir o Braille das tuas curvas...
Estou aqui para poder articular a ortografia que combinaste para me tocar...
Será que ainda aí estás?
Será que a tinta tocou a pena ou os teus dedos?
Será que a tinta está a correr nas linhas do papel ou será que cada tecla que tocas é para juntar as letras do teu nome?
Estou aqui...
A delirar? Talvez...
Espero por ti...
Acordo porque te quero ver...
Estou aqui...
Com os olhos abertos à espera de ver a luz do teu olhar... Ou de poder tocar na tua pele... suave... textura de papel, travo doce...
Estou aqui...