30 dezembro 2007

Livros… para oferecer?

Nesta época festiva, questionei-me sobre o “fenómeno” que ainda decorre quando compramos um livro.
Se compramos uma camisola, umas calças, um cachecol… na loja, dizem-nos o preço, entregam-nos o saco, dão-nos o recibo, “Muito obrigado” e pronto.
Se entrarmos num café e pedir-mos dois descafeinados mesmo estando sozinhos, não nos perguntam se o outro é para oferecer. Se pedimos dois sumos, devem pensar que temos muita sede ou virá alguém ter connosco.
Quando compramos um livro, é habitual perguntarem: “É para oferecer?”
Por que será?
Concordo que um livro é sempre um bom presente.
Para quem lê: um bom companheiro, para quem não lê, começando pelo livro certo, poderá ser a rampa de lançamento para o mundo fantástico da leitura / literatura.
Para mim, um livro é um bem tão essencial como a roupa. Podia dissertar sobre a necessidade da literatura, sobre o auxílio à cultura de cada um, para o enriquecimento do conhecimento e do vocabulário, podia falar sobre a necessidade bibliófila de ler ou de ter um livro, podia falar das histórias mais ou menos fantásticas, mais ou menos reais que nos prendem enquanto temos um livro na mesa-de-cabeceira. Mas não, escrevo simplesmente que, para mim, o livro é um bem essencial.
Vejamos, trabalho com livros: dá-me prazer, salário, etc.; leio um livro: tenho uma história, posso ter uma experiência, posso sentir-me (ou não) ligado àquela história ou a uma personagem presente; não sei o que hei-de oferecer porque o meu amigo não gosta de roupa vermelha, não sei o tamanho que veste, não conheço os gostos clubistas, enfim, se eu escolher um bom livro, gostará com certeza.
Será que a pergunta quase inevitável nalgumas livrarias “É para oferecer?” é resultado de um país como o meu?
Será que, por estarmos habituados a estudos e mais estudos que nos vendem a dizer que o meu país lê pouco, isso nos influencia de tal forma que quando vemos alguém comprar um livro, pensamos que não é um bem para o mesmo consumir mas antes um bem para oferecer?
Quando comprar um livro e me perguntarem se é para oferecer, vou responder:
“Não, é para consumir.”

O que me interessa realmente é que consumam, usem, ofereçam, sirvam como companhia, durmam com eles no pensamento, mas… leiam livros.

Procuro-te

Onde andas? Onde estás?
Desencontros…
Pego no telemóvel para te ligar, não atendes.
Vejo que me ligas mas não consigo atender.
Nem a tecnologia nos ajuda.
Caminho pela rua sempre em busca de alguém como tu. Será que busco “alguém”? Não, procuro-TE.
Finalmente falámos!!!
Estava com saudades da tua voz, mas ainda tenho saudades do teu olhar.
Na verdade, estou com saudades desde o momento que me despedi de ti.
Posso estar contigo todos os dias, posso falar-te todos os dias, mas a verdade é que sinto a tua falta assim que nos separamos.
Não sei se alguma vez te toquei de forma que não me esqueças. Gostava que te lembrasses de mim, gostava que sentisses a minha falta. Egoísmo ou presunção? Já aqui te escrevi que sou um egoísta no que ao teu interior diz respeito. Presunção… gosto de mim e gosto que gostem de mim… não será isto presunção…
Como te encontro? É essa a pergunta que tenho no pensamento…
Como posso ver o interior de ti?
Estarás a pensar que desejo mais do que eu realmente posso ter. Não quero os teus segredos, não quero o teu espaço, não quero monopolizar-te o pensamento.
Só quero poder chegar até ao teu interior, ter o meu espaço dentro do teu…
Tenho saudades…
Normalmente temos saudades daquilo que alguma vez já tivemos, sentimos a falta do que alguma vez já possuímos…
Eu tenho… saudades da tua parte que nunca tive… sinto a falta daquilo que é teu e que nunca possuí…
Neste tempo de proximidade, paradoxo… onde estás? Não sei mas estás longe…
Procuro-te…

28 dezembro 2007

Mais um Natal que passou…

A festa “religiosa” que nasceu de um prenúncio pagão.
Aquilo que hoje é a festa natura de Jesus é, afinal, o evento religioso que foi gerado pela chegada do solstício.
A vinda da luz ou a viragem dos dias pequenos para os dias grandes foi o motivo pelo qual a religião ligou este momento ao nascimento de Jesus.
Natal: tempo de luz (iluminações de Natal a consumir enormidades de energia depois de campanhas de sensibilização para poupança da mesma em tempos de contenção), tempo de doces (e dos donos dos ginásios a esfregar as mãos de contente), tempo de consumismo (quando na realidade o que interessaria era, dar (sentimentos) sem esperar receber), tempo de mensagens iguais para os colegas de trabalho, colegas do ginásio, colegas da associação, etc, mas tempo de criar uns sms personalizados para os amigos ou então deixar este tempo passar, pois os amigos são de todo o ano e não de uma só época.
Por falar em consumismo, o Pai Natal (figura incontornável desta época) tem uma imagem criada pela Coco-Cola. O senhor vestido de vermelho com barbas brancas e uns óculos que dão a sensação de ser avô, foi criado como produto de marketing da marca mais bebida no mundo inteiro.
Agora pergunto: se no resto do ano também há Coca-Cola, por que razão não há também o espírito de harmonia que se vende em Dezembro?
Natal é também tempo de tradições. No norte e no país em geral: o tradicional bacalhau com batatas, no sul: o peru. Os doces, rabanadas, sonhos, bolo-rei, frutos secos, etc.
Natal é tempo das pessoas pensarem que só há doentes nesta altura do ano, Natal é tempo de pensarem que vamos fazer bem aos desprotegidos, é tempo de dar aos pobres porque nesta altura eles precisam…
Pensemos bem nas nossas atitudes!!!
Será que, em Janeiro, no dia 6, dia de Reis e dia em que se encerram as festividades, deixará de haver pobres? Deixará de haver desprotegidos? Deixará de haver bondade?
Nesta altura do ano até se faz cessar-fogo nas maiores guerras do mundo. As guerras capitalistas baixam arsenais, as guerras do petróleo (mesmo mantendo os altos preços) baixam a agressividade.
Vamos deixar que estes sentimentos se mantenham no resto do ano.
Natal é tempo de família. No resto do ano não lhe damos valor?
Podemos passar longos períodos sem vermos a família mas sabemos que podemos contar com ela sempre que precisarmos. Sabemos que passamos mais tempo com os colegas do trabalho, da escola, com os vizinhos, mas também sabemos que a família não escolhemos, é a nossa família e estará lá sempre que precisarmos.
“Natal é quando um homem quer…”
Mas por que será que o homem não quer mais vezes ou não quer durante todo o ano?

03 dezembro 2007

Conto de Natal (I)

Maria pedia na rua para poder ter, pelo menos, uma refeição quente por dia. Sete anos e já era independente. Não dependia de nada nem de ninguém para decidir por onde caminhava a que horas se levantava, que roupa vestia. Tinha uma explicação: há dois anos foi abandonada pela mãe. Há dois anos passava os dias com ela na rua. Eram dependentes uma da outra. Há dois anos elas eram uma família a duas. Mãe e filha. Há dois anos Maria tinha uma mãe que lhe apertava a roupa nas noites frias do Inverno. Há dois anos, Maria partilhava a mesma sopa com a mãe.
Porque foi abandonada, Maria não sabia explicar mas não culpava a mãe.
A mãe tinha sintomas de uma doença grave e pensou entregá-la num abrigo para crianças. No dia em que faleceu, há dois anos, sem forças para caminhar, pediu a Maria que lhe fosse buscar algo quente. Pediu para trazer ajuda e antes de se despedir, disse que a amava.
Maria, então com cinco anos, correu para pedir ajuda para sua mãe. Por mais rápida que chegasse a ajuda, Maria nunca chegaria a tempo de salvar a sua mãe, tinha falecido assim que se separaram.
Não deixaram que Maria visse o adormecer de quem a trouxe ao mundo. Desde então, a menina pedia na rua. Nesta altura Maria enchia-se de luz. Os seus olhos brilhavam com as iluminações de Natal.
Como nunca tinha tido um presente de Natal, Maria não percebia o que significava a imensidão de sacos que toda a gente transportava nesta altura do ano.
Pensava que cada saco levava uma luzinha para colocar no pinheiro. Quem mais sacos leva, mais luzes tem no pinheiro.
À noite, Maria tinha a companhia do presépio da cidade para dormir. Aconchegava-se no meio das figuras dos animais. Por detrás do burro e da vaca estava o calor que a mantinha viva – era a família que nunca tinha tido.
Na véspera de Natal, Maria sentia muito frio e quando estava prestes a adormecer, foi visitada por uma luz que a aqueceu. Maria não teve medo e pediu, sem hesitar, o seu melhor presente de Natal.
Maria não queria uma boneca, não queria riqueza, não queria ter muita coisa; Maria pediu para voltar a ver a mãe e, se lhe fosse permitido, poder colocar uma luz no pinheiro com a ajuda dela.
A luz que pairava sobre ela, levantou em direcção ao céu deixando um rasto brilhante.
Na manhã seguinte o presépio tinha vida, Maria tinha realizado o seu sonho. A menina que pedia na rua tinha dado vida ao menino da manjedoura.
O pinheiro de Natal tinha mais uma luz (a mais luminosa de todas), Maria acendeu-a com ajuda da sua mãe.

02 dezembro 2007

100 título (I)

Banco de jardim na praça onde moras. Os sinos da igreja que existe aqui perto, fazem soar duas badaladas e a lua está bem por cima de mim neste tecto de estrelas.
Um mendigo cobre-se com jornais nesta noite fria de Dezembro. Ele olha-me desconfiado sem saber o que faço eu, bem agasalhado, sentado junto ao coreto. Podia meter conversa, podia pedir-lhe um trago de bagaço que está na garrafa que tanto lhe serve de almofada, como de companhia, como também de fornalha. Tento pensar no quente que estaria dentro de uma sala com lareira que não tenho.
Que loucuras cometo, a sonhar com o momento em que vais abrir-me a porta para eu entrar.
À minha volta, candeeiros que fazem sombras atrás das árvores, o coreto onde ao domingo se fazem os concertos da banda filarmónica, os bancos de jardim onde aprendi a namorar. Naquele onde está o mendigo, escrevi o meu nome e adicionei-o ao teu. Sei que não sabes disso mas, um jovem apaixonado como eu, publicava seus amores riscando num banco de jardim. Hoje escrevo para ti, olho-te com expressividade e sei que por vezes me lês (o olhar e os meus escritos).
Estou mesmo esperançado que um dia abrirás a porta e me convidarás para entrar, não só na tua casa, como também no teu mundo.
De quando em vez, fixo os olhos na janela do teu quarto na esperança que sintas algo que te faça vir tomar esta brisa fresca e veres-me como alguém sempre presente. No fundo, sei que já não moras aí, sei que não virás ver-me, sei que não poderás abrir-me a porta do teu mundo mas sabes que continuarei aqui a fazer companhia ao mendigo.

13 novembro 2007

Se eu não (te) visse

Sentiria o teu cheiro em vez de conhecer o teu olhar,
Saberia de que alegrias é feito o teu dia pelo tom da tua voz,
Poderia tocar cada palavra que me dizes com tacto subtil,
Leria os teus lábios com as pontas dos meus dedos,
Mas beijar-te-ia com todo(s) o(s) sentidos…

06 novembro 2007

Escrita = Liberdade

Muitas pessoas escrevem, mas quantas sabem realmente escrever? O que um escritor faz, é colocar a palavra em liberdade. Eu não tenho esse dom. As palavras que escrevo estão presas a mim e o que faço, é soltá-las. Se elas são, a partir daqui, livres… não sei.
Um dia quando alguém me ler, se isso acontecer, então saberei se as palavras tomaram o prazer da liberdade.
De uma coisa estou certo: sou livre quando me prendo à escrita.

05 novembro 2007

Valor

Há uns dias pus-me a pensar na palavra valor. Eu defendo valores, eu tenho os meus valores, existe uma bolsa de valores, os jovens perguntam na escola “quantos valores tiveste no exame?”, esta ou aquela pessoa têm determinado valor para mim, as coisas têm valor, as casas são vendidas por valores muito acima do que realmente valem devido à especulação imobiliária.
As coisas têm valor palpável e as pessoas têm valor sentimental.
Esta premissa não será assim tão válida dentro dos meus valores. Senão, vejamos a minha perspectiva.
As coisas que o meu avô me deixou, têm muito mais valor do que os valores que algumas pessoas defendem. Por outro lado, há pessoas que valem aquilo que produzem – têm valor monetário, material. Outros têm o valor das cores que defendem.
Eu gosto de defender valores, eu gosto de me identificar com eles.
E eu? Quanto valho eu no mundo?
Tenho o meu valor. Sem falsas modéstias não me sinto menos do que os outros em termos de valor pessoal, também não me sinto mais do que outros demais indivíduos. Andamos no meio de uma multidão sem valor por si só mas que circula em torno disso mesmo, valores. Uns buscam os monetários, outros, a defesa dos próprios. Outros há, que não os têm.
As pessoas que defendem valores têm personalidade. Por vezes, temos de deixar o nosso orgulho de parte para podermos viver em sociedade mas não gosto que coloquem em causa os meus valores em função de algo que quero atingir.
Quanto vale um pedaço de papel com uma inscrição? Um escrito de um grande das letras pode valer muito para uns e não ser mais do que um guardanapo rasurado para outros. Uma nota pode ser a porta de acesso a mais um bem ou pode não ter qualquer valor para quem necessita de outro tipo de valor.
Posso estar só no meio de uma multidão, assim como posso ser pobre no meio da toda a riqueza. Os novos-ricos, assim não pensam.
O meu bem mais precioso é a vida. Há dias, soube de um livro que foi lançado sob o título: “ninguém morre duas vezes”, eu tive a sorte de “nascer duas vezes”.
Que valor tem este texto? O valor de cinco minutos que demorei a escrever.
E para ti, que valor tenho?

02 novembro 2007

Sociedade Gepetto

Vivemos hoje numa sociedade com toda a pomposidade dos nomes que lhe dão: Sociedade da Informação, Sociedade livre, Sociedade para Todos, etc, etc, etc… que nos faz pensar que somos livres.
Será que é mesmo uma sociedade livre ou será uma sociedade controladora de tudo e de todos?
Alguma da generosidade que vemos hoje em dia, é o resultado da vontade de controlar.
Há muito tempo atrás, por altura das terras feudais, um homem muito rico que detinha terras e terras onde trabalhavam aldeias inteiras, percebeu que as pessoas perdiam algum do seu tempo e despendiam muitas energias no final de um dia de trabalho para irem ao rio buscar água para suas casas. Certo dia, decidiu construir um poço no meio do seu feudo para que as pessoas pudessem abastecer-se de água. Para acrescentar a este acto mais um pormenor de generosidade, permitiu que os seus subordinados fossem buscar água durante uma hora no decorrer do dia de trabalho. A única medida de ordem que tomou foi colocar um dos seus homens a manter a disciplina no poço pois iria muita gente buscar água.
A ideia agradou a todos e o acto generoso foi falado para além dos seus feudos. O assunto aumentou os créditos de tão nobre senhor.
Durante largos meses o povo sentiu-se agradado mas, a certa altura, alguns deles começaram a deixar de ir ao poço. Rapidamente, esta atitude da população chegou aos ouvidos do Senhor feudal.
Desagradado com o afastamento do poço decidiu mandar investigar esta nova tendência e recusa da população em relação à sua generosidade.
Durante anos e anos, a população encontrava-se, no final do dia, junto ao rio, para poder pôr a conversa em dia, para se distrair e para se divertir fazendo as trocas directas dos seus bens. Com a criação do poço, a população não tinha muito tempo para conversar e mesmo que o fizessem, tinham a “companhia” do guarda do poço. Perderam a possibilidade de conversar, de se divertirem e, principalmente, de exprimirem opiniões.
O poço de generosidade que era o Senhor feudal tinha-se tornado no poço que lhes dava água mas que lhes tirava liberdade.
Um acto de generosidade que tinha como principal objectivo, o controlo de uma comunidade.
A sociedade de hoje, cria, transforma e controla os movimentos de todos os elementos mesmo quando nos parece que tem gestos de generosidade. Somos o Pinóquio nas mãos de um Gepetto mau. Cada ligação a um espaço, a um emprego, a uma organização, cada adereço de tempo que nos marca o ritmo, são como que as guias de uma marioneta de madeira frágil ou forte conforme a firmeza dos tecidos que constituem cada um de nós mas que nos “levam” por caminhos já traçados.

16 outubro 2007

A mulher e o livro

Estás na minha cama como um livro repousado em cima da minha secretária. Que história terás para me contar. Estou expectante. Olho para ti como se fosse a primeira vez que te encontro num amor à primeira vista. Nunca pude imaginar que pudesse encontrar-te assim.
Admiro o teu rosto – título de um livro, olhas-me com receio que eu fixe o olhar e me apaixone irreversivelmente por ti, se calhar já é tarde para fugires. Puxo o lençol até ao teu ombro como quem lê simplesmente o prefácio de um romance que quero viver. Antes tinha passado os dedos pelos teus lábios – qual página de rosto.
Começo a sonhar com o início de uma aventura contada no livro que está defronte de mim…
Toco suavemente nos teus ombros, já entrei na história. Sinto a textura da tua pele – qual bibliófilo descendo cada página até à sua base onde a vira lentamente. Gozo cada momento em tuas páginas. Em cada viragem de folha, emanas o aroma silvestre do gel que te cobre em cada banho – quererei ser eu um tipógrafo para poder gravar em ti cada momento a dois?
Este momento é único, estás escrita nos meus lençóis como um poema numa folha branca.
És suave, és profunda, és poema…
Chego a meio da história e estou a tocar nas tuas costas. Curioso para continuar a história, estou deliciado com o que até aqui li. Olhas-me, de soslaio, por cima do teu ombro despido.
Deslizas docemente até mim e deixas que eu te sinta. Qual livro aberto para que eu seja parte do romance.
Letras em relevo a chamarem por mim… será que estou a ler correctamente o teu olhar?
És suave, és profunda, és poema…
Num gesto apaixonado, faço os nossos corpos rimarem… roubo-te um beijo.
Sorris com este capítulo e dizes-me, em verso, palavras que me fazem sonhar…
Apaixonei-me pela tua literatura com o novo romance que me anunciaste:
“Beija-me outra vez…”

Um plano teu

Ora te aproximas, ora te afastas…
...fixo em ti toda a minha perspectiva. Quero sempre gravar em mim um instante teu. Quero poder ter comigo um fotograma do teu sorriso.
Passam os dias, nem sei qual será o filme de amanhã…
“Imagens que me passam pela retina”… o que me trarão com a nova aurora?
Mais um pouco de ti… Mais uma janela de sorriso, mais uma fotografia em movimento para que eu grave em mim…
Como te consigo ver por entre este oráculo que é a minha pequenez? Parece que consigo aproximar-me de ti com um simples toque ou quase uma simples vontade mas não te alcanço.
Se tenho uma imensa vontade, se tenho um forte querer, se te consigo guardar em memória e te revejo atentamente, por que não posso tocar-te?
Só consigo ver-te… Com mais ou menos luz só te alcanço em vista…
A ausência de luz no teu rosto prejudica a fotografia. Como posso perceber todas as formas da tua face se alguém te ensombra a tez? Quero pelo menos ver-te com clareza.
Terei sempre um pequeno raio de luz para ti: para que se perceba cada curva do teu rosto e para que se ilumine o sorriso que tens para dar.
Tenho fita para gravar e acompanhar o teu sucesso.

11 outubro 2007

"ser" amigo

O que é ser amigo? Que é nutrir amizade por alguém?
Tenho amigos. Poucos.
Tenho colegas – muitos. De trabalho, de escola, de futebol, de amigos comuns, etc.
Mas amigos, esses são poucos.
Tenho amigos que fazem tudo por mim, aqueles que dão a camisa do corpo, aqueles para quem ligo e têm sempre uma palavra para mim, aqueles que me fazem ver as coisas quando cometo um erro, aqueles que me ajudam desinteressadamente.
Também gosto de ser amigo. Gosto de ajudar, os meus amigos sabem que sim.
Que texto piegas este, mas a verdade é que tenho de o escrever.
Como se começa uma amizade? Não se sabe. As coisas vão-se revelando, depois vemos que conseguimos viver com os defeitos do nosso amigo.
Agora a questão é:
Como se acaba com uma amizade?

28 setembro 2007

Coisas simples

Gosto de passear pela areia com os pés descalços, ouvir o bater das ondas, sentir o frio salgado que me toca na pele...
Gosto de sentir a simplicidade com que se arranca um sorriso a uma criança.
Gosto da vida de um pastor que consegue ler um livro na calma pastagem das suas ovelhas...
Gosto de todos os pormenores do teu olhar...
Gosto da maneira como tocas levemente as minhas mãos...
Incompreensivelmente, gosto da maneira subtil como mudas de conversa assim que mostro que gosto de ti...
Gosto de coisas simples, gosto de pessoas simples, gosto de...
TI...

23 setembro 2007

Mundo heterogéneo

O vidro deixa transparecer uma rua com árvores a todo o seu comprimento. Por entre elas, um esquiço de azul do céu. Lá fora o ar livre do vento que sopra de norte. É um ambiente fresco mas o sol aquece-o.
Por detrás do mesmo vidro, um barulho do ar condicionado que conserva o ambiente e que me vou habituando.
Pessoas sentadas, mergulhadas em mundos diferentes: actualidade nos jornais que mais tarde vai ser a história que os nossos netos vão estudar; estudos (semi) científicos dos mais variados assuntos; leituras de prazer dos volumes clássicos das sociedades russas do início do século XIX (e, simultaneamente, tão actuais) que alimentam tanto as mentes mais experientes como as mais frescas, as leituras leves dos novos executores de páginas e operários da escrita, o consumo técnico dos escritos de método que aquecem os neurónios académicos.
Há os tecnólogos que se fazem acompanhar pela mala com o portátil. Têm mais cuidado com o portátil do que consigo próprios. As suas carreiras estão a começar no disco rígido do computador e os relatórios, os trabalhos, as pesquisas, são reunidas em ficheiros como de um diário digital se tratasse.
Quantas mentes brilhantes dentro desta casa. Mas quantas delas terão oportunidade de brilhar realmente?
Outros há que o seu mundo se reduz a um leitor de mp3 e que os faz oscilar as cabeças mais parecendo aqueles bonecos de caco que os camionistas trazem no tabelier. Estão à espera de “ir à net sacar mais umas músicas” ou de procurar umas cenas para um trabalho que o prof mandou fazer. Comentam com um amigo sentado no sofá do lado: “Ouve-me este som!!! Bué de curtido!!!
O amigo levanta o sobrolho como que a dizer ironicamente “é fixe”… e volta a mergulhar-se na revista em que está a bike dos seus sonhos.
Depois há os cinéfilos (ou clientes de imagens em movimento) – os de blockbusters ou os de cinema de autor. Os primeiros procuram as estreias e o mundo hollywoodesco que os ocupa em tempo de ócio e das tardes/noites vazias. Os segundos, procuram os clássicos e os grandes filmes em que Bergman é mestre – referência das escolas de cinema. Lêem atentamente a sinopse de cada filme, com especial olhar para os directores de fotografia, os produtores, os actores, os argumentistas, etc.
Há os habitués – que sabem como funciona a casa do conhecimento, cada canto, cada movimento, onde se guardam os números das revistas mais antigas.
Há os curiosos – que olham para tudo com olhar de descoberta, há os que acompanham os filhos nos primeiros trabalhos da escola que agora começa e que se preocupam mais do que aqueles para que encontrem o que procuram.
Há os pais extremosos que levam os meninos, desde cedo, à companhia dos livros, do ambiente do conhecimento e do saber. Contam-lhes histórias, mostram-lhes os livros, etc.
Há os investigadores e autodidactas que procuram tudo, por curiosidade, por necessidade, simplesmente por vontade de aprender. Querem saber mais da terra onde nasceram, dos costumes dos seus antepassados, do nome da rua onde nasceram seus avós.
As mostras que patenteiam no amplo espaço desta casa trazem outros personagens: os autores que se dão a conhecer na sua forma de arte e os novos amigos, os que nos querem conhecer (naquilo que somos e que damos a conhecer).
Que mundo tão diferente: de necessidades, de procura, de ocupação de tempo, de busca do saber e, ao mesmo tempo, tão igual. Todos estão na mesma casa, todos estão imbuídos num mundo tão seu…
Tudo nesta casa: letras, sons, imagens… sentidos despertos, porta aberta ao conhecimento…

11 setembro 2007

Desapareceu!!!

E se, num belo dia de Verão, chegasse ao local de trabalho e o tivessem levado? Literalmente!!!
Se tivessem fugido com o escritório?
Levaram a sua secretária! Tudo bem, devem trocar por uma nova. Tiraram-lhe o seu computador – deve ser para o reparar.
Mas se lhe levassem as paredes do escritório? O que fazer?
Imagine chegar a casa depois de um dia de trabalho e estar a pensar colocar o carro na garagem, descer os estores, tomar uma bebida fresca na varanda da cozinha, ver o pôr-do-sol ao som de um jazz bem interpretado e quando chega à sua rua não encontra a sua casa!!!
Roubaram o carro? Pois, até era um carro bom. Suscitava olhares dos amigos do alheio e até é fácil levar um carro (ele anda).
Levaram-lhe a carteira de cima da mesa do café? Pois, numa distracção um estranho que passou, teve a ousadia de o levar e até nem conseguimos lembrar-nos da fisionomia dele.
Mas, e se levassem o lugar do estacionamento ou se levassem todo o café? Já pensou querer tomar um café no sítio do costume e terem levado tudo.
Como se tivessem pegado no café, lhe tivessem colocado sobre rodas e o tivessem mudado de lugar?
Se isto acontecesse, o que fazer?
Quem o levou?
Estamos habituados a ouvir falar de desaparecimentos de diversas coisas. Carros, roupas, adereços até mesmo pessoas (até parece moda). Tudo coisas móveis, coisas que com maior ou menor esforço, mudam de lugar.
Mas imóveis?
Pois bem, hoje aconteceu-me.
Cheguei ao meu local de trabalho e tinham levado tudo. Paredes e o seu recheio!!!
Sem mais, levaram tudo.
Fiquei órfão do meu trabalho.

08 setembro 2007

A crueldade dos mais novos

Há uma inocência que protege tudo o que as crianças dizem. Seja a adultos ou a outras crianças, tudo o que dizem é sempre sem a mais pequena partícula de maldade mas, por vezes, pode ser tão cruel ao ponto de fazer pensar muito os mais inteligentes adultos.
Quando eles começam a crescer, queremos que saibam tudo. Perguntam todos os “porquês” querem saber por que razão hoje vestimos verde ou amarelo. Porque razão a fruta é boa. Por que têm sempre de comer a sopa antes do bife e das batatas fritas que tanto adoram.
Depois começam por escolher a roupa.
Não querem aquela camisola castanha, porque não! Não gostam daqueles calções, porque não! Querem aquelas sapatilhas, porque sim!
Enfim, “santa paciência” – proferem os mais calmos progenitores.
Depois, há os comentários que começam a fazer. Quando dois adultos conversam das mais diversas coisas, as crianças podem estar o mais distraídas possível, podem estar a brincar com o carrinho ou a boneca quer mais adoram mas, de repente, ouviram a conversa toda e são capazes de a relatar, tim-tim por tim-tim, no meio de um grupo de amigos dos seus pais. Quanta crueldade!!!
“O pai abraçou a mãe na cozinha” – aceita-se, mas se for: “o pai pediu á mãe para tomar banho com ela e ela disse para ele ter juízo…”, já começa a envergonhar. Mas há os piores...
Ou então quando os seus pais têm um comentário mais provocador ou uma atitude mais adulta como um amasso no corredor ou um carinho na sala, os mais novos contam com a maior das naturalidades tudo o que se passou.
Mas depois, há as questões sérias que os mais novos não são capazes de conter. Se vêem alguém sem cabelo, mesmo que se trate de alguém muito doente:
- Olha o careca!

Estão os pais no pediatra a contar como o menino é bem comportado. O menino solta um barulho e o pai tenta fazer de conta que não foi nada até que o menino se ri e diz tocando no pai:
- Dei um “pum”.
O pai tenta ignorar mas começa a ficar corado.
Mais uma vez e mais alto:
- Pai, dei um “pum”… eh, eh, eh…
O que fazer?

Os pais estão no Shopping no final de uma semana de trabalho. Levam os mais novos para aquele espaço para que eles vejam coisas diferentes e se distraiam. Primeiro, querem fazer chichi, depois, têm sede, depois, têm fome. Querem isto e aquilo. Começa a aventura.
Vão comer a uma pizzaria para que eles gostem. Pedem uma pizza familiar mas, antes disso, duas sopas.
Beicinho, choro, grito.
“Eu não quero sopaaaaaaaaa…”
Os pais, fazem um sorriso amarelo, incomodados com tal “berreiro” e tentam falar com eles entre os dentes mostrando-lhes que não podem gritar e que os meninos que gritam são feios ou que vem o homem mau buscá-los.
Chega a sopa, berreiro maior do mais velho.
O mais novo come a sua com a maior da rapidez (ainda não sabe o que é pizza).
O outro, que já se apercebeu que vem a pizza, faz uma birra descomunal.
Será que os pais merecem esta crueldade dos seus filhos depois de tanto esforço e de uma semana de trabalho?

A tia vem da aldeia para ver o menino.
A meio do jantar, o menino começa com as travessuras do costume (caretas, fitas, brincadeira com o arroz). A tia belisca-o por debaixo da mesa para que este pare com a brincadeira. A seguir, o comentário:
- Mãe, a tia beliscou-me!!!
A tia fica corada.

Maldade, inocência, traquinice, enfim, características intrínsecas a gente de palmo e meio.

07 setembro 2007

sentinela maltês

(c) hj 2006

A viagem que nunca fiz III

Consigo sentir a tua pele, consigo sentir o teu respirar… até onde iremos? Para onde nos leva este percurso? Que viagem estamos a fazer?
Não quero saber, quero somente poder gozar esta viagem contigo.
Perdemo-nos por entre os caminhos cruzados dos nossos gestos. Estou a sentir-te perto de mim, quase juntos… os dois corpos formam um só, numa fusão de desejo, sentimento, vontade, impulso…
Seguras o leme como que conduzindo tudo…
Estamos defronte para o mar, estamos com todo o caminho pela frente, estamos sem destino traçado.
Por vezes penso se estarei a sonhar ou somente a escrever algo que desejo e não a viver esta viagem realmente.
Vivo cada momento sempre a pensar no próximo que termos juntos.
Envolvemo-nos nos teus lençóis. Estou a arder de vontade de te ter. Tu deixaste levar.
Passaram duas horas de intenso prazer, de temperaturas extremas, de abraços envoltos um no outro.
Caiu cada um para seu lado.
Que vontade, que prazer, que satisfação…
Melhor, que desejo realizado…
Cheguei a um porto… por este teu mar naveguei. A início tive medo de me meter ao caminho, tive medo de te contar os meus desejos e sentimentos por ti. Tive receio de me sentir rejeitado ou de te afastar…
O teu domínio sobre as coisas a tua capacidade de liderar as situações e a minha vontade de ser liderado por ti, a minha admiração pelo teu ser, pela tua vontade, por tudo aquilo que és fez o resto e deixou-me ter um pensamento sempre ligado a ti.
Posso dizer que viajei?
Posso pensar que algum dia me acompanharás numa viagem como esta?
Posso legitimar a vontade que tenho de te ter?
A viagem que nunca fiz mas da qual tenho um guia dos locais a visitar…
Quero viajar contigo…
Fim

06 setembro 2007

sangue que me corre nas veias...

(c) hj 2007

Acordei irado…

Enquanto olhava o infinito, veio um pensamento ter comigo sobre as coisas que me irritam e que, se pensarmos um pouco, podem irritar alguém (como eu…)
É muito chato pensar que vamos comprar uma carteira, em pele para durar mais tempo - dizemos nós - e, por mais compactas que as procuremos, temos sempre de comprar um “calhamaço” enorme pois o nosso BI é tão grande que parece um cartaz de supermercado a fazer promoção a um vinho qualquer.
A forma como nos vestimos é algo que me irrita um pouco. Porquê insistimos em vestir uma roupa melhor ao Domingo, só porque é Domingo. Eu que até sou religioso, tento manter algum respeito com essas coisas da religiosidade. Não o faço por subserviência à Igreja instituição, conservadora nos seus píncaros. A "Instituição" que apregoa a não-ligação aos bens materiais mas que detém acções da FIAT e da Ferrari, mais a Danone, que tem os corredores do Vaticano rodeados de riqueza e ostentação dos bens materiais. (Sim, ainda sou Cristão, porque acredito em Deus). Irrita-me vestir a melhor roupa para a missa não por respeito mas para mostrar no adro à saída como se fazia antigamente na aldeia.
Irrita-me a mania de chamar os empregados de mesa de “Faxabor” (!!!) Os empregados de mesa têm nome.
Concordo que não sabemos os nomes deles mas e se esperarmos que olhem para nós ou em vez de gritar um “faxabor” no meio de uma esplanada nos levantarmos e formos pedir o que queremos. Eles são funcionários do café ou restaurante, não são nossos escravos.
Irrita-me a maneira como as pessoas não cumprimentam à entrada de um estabelecimento. Entram mudas e saem caladas, excepto se empregado ou empregada (jeitosa) nos olhar simpaticamente e nos disser “Boa Tarde”. Então aqui já se olha com ar de graça de até sorri. Mesmo aqui há o outro lado da moeda. Irrita-me a perseguição que alguns empregados de loja nos fazem para saberem se queremos algo, se queremos o número acima ou abaixo da camisola que fomos experimentar, se pretendemos mais cores só porque estamos a experimentar uma amarela… (sabem lá do que gosto).
Irrita-me a forma como se rotulam as pessoas pela roupa que vestem ou pela profissão que têm. Se são funcionários públicos: não fazem nada e estão cheios de regalias. Estarão assim tanto? Então também quero ser – pensam todos os críticos. Se são cantoneiros ou “Homens do Lixo”: ou têm apelido Almeida ou são sujos. Já pensaram que Silva é o nome mais português e não Almeida? E se eles trabalham a limpar é porque privam a higiene e não a sujidade.
Por falar em sujidade, irrita-me que ainda se atirem papéis para o chão quando há uma infinidade de papeleiras espalhadas pelas cidades, algumas até são biblot’s das praças e das ruas.
Irrita-me que ainda não se faça reciclagem e que as pessoas que se queixem dizendo que não reciclam porque já pagam muita taxa de salubridade. Já pensaram que pagam muito porque ainda é preciso que se pague a muita gente para fazer o trabalho que eles deviam fazer em casa num simples gesto?
Irrita-me a ignorância. Não dos que a têm (pois também a tenho nalgumas matérias, e não são poucas) mas daqueles que a querem continuar a ter.
Irrita-me a falta de civismo que há nas estradas: estão dois carros a aproximar-se da rotunda e é ver qual deles acelera mais para chegar primeiro que o outro. “Assim tenho prioridade”.
Porquê chegar primeiro? Já pensaram que se alguém for em primeiro e cometer um erro, nós podemos não o cometer de seguida?
Irrita-me a moda. Se este ano se veste castanho, eu tenho de vestir castanho, se se usa rosa eu tenho de vestir rosa. Não tenho nada contra as cores mas só vestirei rosa quando me apetecer e não quando for moda, mesmo que o meu clube tenha optado por uma indumentária revolucionária que não é mais do que uma estratégia de marketing.
Irrita-me a mania de pensar que conseguimos arranjar uma TV se a abrirmos. Primeiro, não nos compete. Segundo, podemos destruí-la de vez. Terceiro, não somos técnicos de audiovisual e não percebemos nada daquilo.
Irrita-me a mania de ter um telemóvel diferente todos os anos,... qualquer dia nem fazem chamadas.
Irritam-me os lights das bebidas sem calorias e carregadas de açúcar e dos iogurtes 0% gordura…
Irrita-me a mania de não ler avisos nem livros de instruções. Primeiro carrega-se em todos os botões e depois, quando virmos que não funciona, então vamos pegar no livro de instruções para sabermos onde fica o botão On/Off.
Irrita-me a mania de “receitarmos” o nosso médico aos nossos amigos pois ele é o melhor e não temos nada a dizer dele. Ele que até nos curou da maleita que nos apoquentava há anos e ainda ninguém tinha descoberto. Alguém vai dizer mal do médico que ainda nos assiste?
Pois bem, talvez nada disto me tivesse passado pela cabeça se eu hoje não tivesse acordado... irado.

04 setembro 2007

O saber

Era uma vez um homem sábio, muito sábio.
Tinha viajado por quase todo o mundo, era culto em diversas áreas, conhecia a música, o cinema, a literatura, a escultura, a pintura, a arquitectura, enfim, todas as formas de arte.
Numa das suas viagens de exploração do conhecimento foi visitar um Templo Budista. Entrou e acho que nada lhe trazia de especial. Cultura minimalista, paredes vazias de ornamentos, poucos paramentos e silêncio, muito silêncio.
Como sábio que era, sabia que não é à primeira impressão que se conhece algo. É preciso perceber o porquê das coisas, é preciso compreender o significado de cada símbolo, signo e/ou forma mesmo que de vazio se trate. É preciso entender que lugar ocupa o vácuo.
Esteve horas a contemplar o que o rodeava. Ora de pé, ora sentado. Deitou-se e começou a admirar o som daquele Templo.
Quase um dia passado e aproximou-se dele um Monge Budista que, depois de saber o propósito de tal visita, explicou minuciosamente cada pormenor do edifício. Mais umas horas de explicação e mais algumas coisas foram assimiladas pelo homem sábio.
O monge budista deixou-o de novo a sós com aquele silêncio de um Templo imperial.
As coisas começavam a fazer sentido na lógica de raciocínios do homem. Cada vez que se fazia luz de mais um pormenor entendido, aos olhos dele, acenava ligeiramente a cabeça em sinal afirmativo.
Perto do pôr-do-sol aproxima-se do sábio um ancião do Templo, o mais antigo Monge daquele local, que proferiu a seguinte pergunta:
“- Então, o que acha deste Templo?”
O homem sábio,, honestamente responde:
“- Sinceramente, quando entrei, achei que este templo não me trazia nada de novo, já viajei muito por esse mundo fora e já visitei Templos, Mesquitas, Igrejas, Palácios, Monumentos, etc. Com tudo o que já vi, a princípio, não fiquei fascinado mas agora acho que começo a perceber o Templo, a perceber o significado dos pormenores e da simplicidade, deste vazio tão cheio de significado.”
Serenamente, o Monge olha para o infinito e diz sorrindo:
“- Fico agradado com tal conclusão. Estou aqui há mais de quarenta anos, todos os dias tento perceber este Templo, e hoje, ainda não o entendi…”
Afastando-se em passo lento, deixa no ar a dúvida maior…

Por vezes, pensamos entender as coisas, afinal não as compreendemos.

02 setembro 2007

Quem são estes seres?



Vidas tão vazias, vidas cheias de nada…
Vidas sem tarefas…
Uns não “vêem”, outros quase não são vistos, uns são grandes, outros pequenos…
Alguns originam seres maravilhosos, outros nunca o serão. Vidas sem rumo mas em constante mutação.
Uns defendem o património (que seres importantes os que guardam os livros), outros destroem-no…
Uns procuram o cheiro, outros a luz…
Há uns que engendram armadilhas para que outros caiam, há os que nelas caem e não saem mais delas, outros há que as evitam.
Uns alimentam-se das fraquezas dos outros ou dos restos dos seres maiores…
Vivem onde as condições lhes permitem, vivem onde lhes deixam…
Parasitas da sociedade!!!
Que vida fútil a dos insectos…

31 agosto 2007

25 de Agosto 2007

Para além do “reino maravilhoso” de Miguel Torga, escrevo umas linhas pouco literárias para lembrar Eduardo Prado Coelho. Cronista, crítico, homem de letras e da cultura em geral. Passou hoje para a morada dos que, como ele, passam a ser imortais.
Estou no Norte, num paraíso em repouso…
Longe do stress da cidade, numa terra onde o movimento que existe é o do padeiro que chega e o do homem do peixe que faz soar a buzina de uma carrinha com mais de vinte anos assim que se aproxima da Vila para se fazer anunciar…
Mais movimento, o dos carros de bombeiros em horas de aflição que por estes dias são o pão-nosso de cada dia. Quem quererá mal a esta gente? Quem quer destruir tal paraíso?
Perdoem-me os alentejanos, mas este verde montanhês é sublime comparado ao dourado das planícies do Alentejo.
Estou numa terra tão longe da metrópole que a melhor tecnologia é a telefonia em que se faz ouvir um anúncio publicitário da zona – enchidos da terra.
O progresso veio com a estrada que atravessa a Vila e que não tem mais de 1km.
“A terra desenvolveu, isto não era nada há 10 anos” – diz o Sr. Francisco que descansa num banco de jardim depois de anos a fio a “amealhar” a vida em França.
Por esta altura vê os filhos e os netos que vêm todos os anos de uma cidade parte de Nice. “Estão a fazer vida” – completa.
Estou sobre este caderno a rabiscar umas palavras na pacatez de Vila Flor…

24 agosto 2007

Ando em busca das palavras

Aprendi mais do que sei
Sei coisas que desconheço
Ando em busca das palavras
Que são lidas do avesso

Faz-me falta
O que já tenho
Dos sonhos que construí
Só as minhas mãos tão cheias
Desmentem o que não fiz

Apenas faço um aceno
Um sinal
Dia após dia
Sentado à beira do mundo
Para dizer que estou aqui
Quem me achar que me acompanhe
Ao lugar de onde parti

A minha vida não para
E corre no meu caminho
Esta teima do destino
Em dar-me o que sempre quis

Faço mais do que digo
Digo mais do que penso
Tenho tudo e nada tenho
Que a tudo e todos pertenço

Olho os homens
Olho o mundo;
Vejo uma estrela cadente.

Letra de música de Luís Represas

20 agosto 2007

A espera

Uma casa no meio de um deserto, uma linha de caminho-de-ferro que atravessa a propriedade…
Todos os dias, à mesma hora, ela espera que o comboio passe e pare mesmo defronte da casa e deixe ficar quem ela espera há mais de dez anos…
Ela ainda acredita que será possível que ele regresse. Partiu há uns anos para defender o seu país. Nos primeiros anos, deu notícias e foi enviando as cartas do costume: saudades, a guerra que custa a passar mais a esperança de voltar são e salvo para os braços dela. Vai pedir a mão dela em casamento. O pai anseia também por esse momento para que a sua filha tenha uma vida melhor.
Também o pai desvia o olhar à mesma hora para que a locomotiva traga consigo um vagão de esperança, pelo menos de esperança.
Mais um dia que passa e a única coisa que vai com o comboio é uma aragem mais corrida que se faz notar no calor intenso que o sol impele ao assentar na terra árida.
Os dias passam no mesmo marasmo, nem um viajante perdido no meio daquele nada, nem um cowboy, nem um ar de boas novas…
Até que um dia, o comboio vem diferente… ela espera que seja hoje que traga novas da guerra. Ainda o espera. Ela prometeu paciência e reserva no lugar a seu lado e, até hoje, nunca esboçou um pensamento de busca de uma nova realidade, de uma nova vida, de um novo alento…
Aproximou-se dos carris, desta vez iria sentir o comboio bem de perto, iria sentir o vento que acompanha os vagões mais perto do que nos primeiros anos de espera.
Passa o comboio à mesma velocidade e ela já começa a pressentir o mesmo vazio deste único movimento por estas paragens ao longo destes anos…
Novas!!! A brisa que vem à boleia do comboio faz esvoaçar uma foto rasgada… era ele. Dentro de uma farda do exército, aprumado como no dia em que partiu. Ar mais abatido. A guerra e o passar dos Invernos aplicaram-se na erosão desta face.
Ela passa os dedos, já marcados pelos anos que passaram, pelas rusgas de uma foto recente com uma imagem gasta pela guerra… Fotografia rasgada, fotografia cortada, como se rasgou, quem a cortou? Era uma imagem de corpo inteiro que fora rasgada a meio. Mostrava-o como soldado… honrado pela defesa da pátria.
Durante dias ela procurou o resto da fotografia. O comboio poderia trazer mais… Mais novas, mais fotografias, o resto desta, o seu soldado aprumado, cansado, neste momento ela queria-o, o estado em que viesse seria sempre melhorado com a sua presença mas ela queria-o perto de si.
Andou infindáveis distâncias junto de um trilho todo igual que não deixou repousar o resto da fotografia…
Num dia, igual a tantos outros, cheios de nada, ela descobriu que o resto da fotografia não mais existia… A guerra tinha-a levado… O seu soldado não mais regressará…

Inspirado num texto de Tonino Guerra.

19 agosto 2007

Faz-me falta

Faz-me falta o teu cheiro no fim do banho, faz-me falta o teu olhar quando acordo pela manhã. Tenho saudades dos tempos em que acordamos na mesma cama, em que saímos do mesmo quarto e que tomávamos café na mesma varanda. Fugiste desta vida.
De que te cansaste tu? De mim? Da forma como te vejo?
Não sou fácil para viver em conjunto. Tenho uma maneira de ser. Nem melhor, nem pior do que os outros, é a minha forma de estar.
Sou preso às minhas coisas, aos meus tempos e espaços. Quero ter vontade própria e quero poder estar onde normalmente não estou.
Se calhar estás cansada daquilo que já vivemos ou tens receio daquilo que eu quero viver. Momentos bons, partilhados com alguma alegria...
Mesmo que me tenha custado por algumas vezes, fiz de tudo para te agradar. Tu não me entendes. Acho eu. Ou se calhar sou eu que não te entendo.
Porque não entendes quando quero ficar ali sentado, só a contemplar aquele momento de serenidade.
Para tudo temos de ter um relógio. Não gosto da finalidade dos relógios.
Estamos de férias e temos de chegar até àquela hora ao hotel. Temos hora para jantar senão, não nos servem. Temos de nos levantar porque já é hora. Vamos sair porque até já é tarde e daqui a pouco é noite. Vamos mais cedo porque temos de ir aqui e ali. Se calhar é isto que nos torna diferentes. Gostas de gozar o tempo em função das coisas que queres viver. Eu gosto de viver as coisas mas nunca em função do tempo.
Chateias-te porque me levanto calmamente e porque não gosto de saber que são horas de me despachar. Chateias-te porque não me levanto da mesa assim que acabo de digerir o último pedaço de sobremesa. Chateias-te porque digo que não me compreendes.
Gosto de viver a vida sem pensar na correria dos dias dos outros e dos tempos que o relógio nos quer impor.
Tu gostas que as coisas corram em função do teu tempo. Se calhar estou a ser um pouco injusto e não estou a aceitar tão bem a tua forma de ser.
Se sou eu que não te entendo, explica-me como queres viver, se sou eu quem não vê as coisas na tua (certa) perspectiva, mostra-me como faço, se sou eu quem não te deixa viver em função do teu tempo, acerta a minha forma de estar. Mas peço-te que o faças sem me tentar mudar.
Já quase me roubaram esta minha forma de ser, não a mudes, diz-me como conseguimos viver os dois dentro das mesmas horas de um dia igual para ambos.
Agora que não te tenho, digo que sinto a falta do teu querer…
Fazes-me falta…

14 agosto 2007

Luto no mar...

Maré-alta mas tudo navega. As redes já haviam sido lançadas e espera-se a melhor hora para as alar. Muito peixe estava já entre o cerco.
O Mestre comanda a companha.
De quando em vez… um brado… as vagas do mar cada vez maiores e era necessário um grito para comandar os homens…
O Mestre era como o mar… às vezes calmo, outras picado…
Ondas se levantam quando revoltado está…
Maré-cheia – sempre… Mesmo calmo, era uma vida…
O Mestre tem nome de livro aberto, páginas vincadas como a personalidade de um homem de mar e de letras…
Muitas vagas passam sobre a pequenez da sua figura mas nenhuma consegue sobrepor-se a tamanha grandeza de voz…
Premissa sempre válida até à hora fatal… no início da noite de 14 de Agosto de 2006, uma enorme onda rouba, aos homens da lancha, o seu Mestre…
Letras desconjugadas, lançadas ao mar… um grito que se ouve ao fundo, no horizonte, no final de uma linha (vida) … Vela que cai sem um mastro firme que a segure…
Ficará para sempre gravado, na vela desta lancha, o nome de quem a levou além-mar num romance sem fim.
Novo rumo para esta lancha… que Norte terá…

à memória de ml…

07 agosto 2007

Na biblioteca

No meio de livros e estantes...
Estou pensativamente a passar os olhos pela página de um livro do qual não sei o título e que peguei ao acaso.
Cada vez que levanto a cabeça, vejo-te a entrar num pensamento mais profundo. Estás diante de papéis que te alheiam de todo o resto.
Não sei o que fazer para te chamar a atenção e te fazer olhar para mim. Estás mesmo concentrada. Não quero provocar-te uma má reacção pois posso interromper um importante raciocínio de uma qualquer operação matemática, ou de uma frase que precisas acabar para completar o texto sobre um filósofo qualquer.
Estamos num mundo do conhecimento e, cada vez mais, desconhecido. Cada vez que aprendemos algo, ficamos a saber que sabemos ainda menos de um universosem fim.
Em que galáxia de inteligência vivemos nós?
Em que vaivém posso eu entrar para ir de encontro ao teu pensamento... Paras um pouco, levantas o olhar e ficas a contemplar o infinito por entre os estores semitransparentes desta casa de livros.
Para que olhas? O que procuras saber? O que queres alcançar?
Não sei o que leio neste livro sem história, mas estou a gostar protagonista que ocupa a minha lógica de juízos.
Quem andará a passear nesse olhar distante…
Kafka? – e quererás transformar-me em algo invisível?
Pitágoras? – e será uma questão de cálculo?
Nietsche? – e estarei no meio de uma teoria sem fundamento?
Eiffel? – e estarás a conceber uma obra de engenharia para levantar algo?
Gostava de saber… mas se eu descobrir, talvez perceba que sei cada vez menos, ou talvez fique a saber que o melhor terá sido não saber mais do que devia.
Prendeste-me a lógica, prendeste-me o pensamento, prendeste-me o olhar…
Mas se a casa dos livros é a porta de acesso ao conhecimento, acaba por ser também o meio para atingir o que está mais além, faz-nos ultrapassar barreiras, faz-nos ser livres à nossa maneira dentro do que queremos atingir…
Mas também podemos ter limites só porque estamos dentro desta casa que nos atribui certas capacidades ou limitações. Esta casa permite-me ver-te com frequência, mas também me aperta o “raio de acção”…
Entretanto, no meio deste pensamento, olhas-me fixamente mas parece que não me vês. Será que estás a olhar-me com um daqueles pensamentos bem longe daquilo que te passa pela retina?
Não!
Quero acreditar que desta vez me viste.
De repente… arrumas os papéis, é hora de sair.
Amanhã cá estarei. Procurarei o mesmo lugar, um local de onde te posso ver, ainda que discretamente, sem saber se me vês, ou se me queres ver… mas sabendo que também cá estarás…

06 agosto 2007

Reencontro

Daniel está sentado no banco da estação.
Espera Adriana que chega de viagem. Estão todo o ano juntos mas Daniel mantém um amor platónico que não pode revelar. Adriana sente que, apesar da dedicação de amizade que Daniel nutre por ela, também terá algo mais no olhar que cruza com ela.
Daniel está impaciente. Ele sabe que o comboio só chegará às 10h00 mas chegou às nove em ponto à estação. Não é seu hábito chegar muito cedo, mas hoje é especial.
Levantou-se cedo, aliás quase nem dormiu com a vontade que as horas passassem o mais rapidamente possível. Não vê Adriana há semanas e está ansioso. Pelo meio, trocaram algumas chamadas mas a proximidade do olhar ainda não é permitida via telemóvel.
Apesar da ausência de Adriana, Daniel manteve-a sempre presente. Quase a todo o instante pensava na hora de reencontrá-la.
Quando Daniel se cruzava com um carro igual ao dela, confirmava se a matrícula (que ele conhece de cor) era a mesma…
Quando o telemóvel tocava, esperava que fosse Adriana. Nem que fosse a dizer um simples “Olá”… ou a dizer… “Desculpa, não sei se me estás a ouvir mas eu não consigo ouvir-te…”
Será que não o ouve mesmo?
Ainda faltam dez minutos, chega um comboio. Daniel fixa o olhar para saber de onde vem este. A voz radiofónica da estação já disse duas vezes:
“Senhores passageiros, o comboio que vai dar entrada na linha dois, teve como partida Terra de Luz”
Apesar disto, Daniel está em fervorosa para ver Adriana.
Conseguirei esperar mais dez minutos? – pensa Daniel – Já que esperei estas semanas, mais dez minutos não serão demais.
Daniel sabe bem que Adriana não é sua exclusividade, aliás nem sua é. Daniel sente-se muito ligado a Adriana. Admira-a, segue o seu exemplo, quer ser sempre amigo dela, quer que o carinho que nutre por ela esteja como o ar que respira – sempre presente.
Pum pum… pum pum… Cantam os carris como se de batidas do coração se tratassem. Ao invés da velocidade das batidas nos carris que vai abrandando, as pulsações de Daniel aceleram à medida que vai percebendo que este comboio traz Adriana.
Daniel só quer um sorriso, como só Adriana tem para lhe dar…
Parou o comboio, saem os passageiros… Adriana não demora a descer os degraus que a trazem de volta à Terra das Letras.
Daniel alegre – todo ele sorri. Chegou Adriana como tanto esperava.
O reencontro dos olhares profundos, fiéis, amigos… cheios de… sentimentos de Daniel.

03 agosto 2007

Chão quente...

Terra que pisas, caminho que quero seguir… em busca das tuas pegadas, sigo cada aroma que deixas para trás. Areia que evapora ondas de calor. Segues a até a língua da maré… procuras a frescura das ondas do mar…
Eu estou de longe a ver-te, a querer ser onda para te poder abraçar, a querer morar na tua pele, nem que seja por breves instantes...
O calor e o sol estão para nós como toda a conjuntura que nos tem separado.
Queria ser praia para, em mim, te despojares de inibições… Por vezes, fico com a sensação que sou eu que guardo conservadoramente a inibição para que continues a banhar-te no meu mar.
Queria que fosse sempre Verão, queria ter sempre a oportunidade de te ter em mim…
Calor, descontracção, frescura, calma… o que procuras quando vens até mim?…
Por onde andas quando só sinto o teu cheiro?
Onde te encontro quando só ouço a tua voz?
Como posso dar-te mais de mim?
Será que me sentes quando lanço a maresia no ar? Onde buscas a frescura quando não temos contacto?
Quero dar-te a cor que buscamos no Verão…
Vem pisar o meu chão.

27 julho 2007

Saber ver...

Quem não entende um olhar,
Muito menos entenderá uma longa explicação...

26 julho 2007

Estou... a ser o que sou

Estou…
Despojado de tudo o que é banal. Comigo, um pensamento envolto em ti. Peço um café. Estou a ler as crónicas que escrevo para ti.
Cada grão de açúcar que mergulha na pequena chávena que repousa na mesa conta as vezes que quero mudar tudo o que escrevi.
Sou piegas e quero ser mais real, sou repetitivo e quero ser singular, sou igual a tantos outros mas diferente de todos eles.
Defeitos meus, pensar que estou certo – saber que posso não estar… ter espírito crítico para os outros mas achar que eu posso contornar a consciência. Posso ser diferente. Não posso mudar o que fiz mas posso corrigir na próxima. Mas na próxima não me lembrarei ou, na próxima, pensarei que já o fiz uma vez e que posso voltar a fazer se mostrar arrependimento. É difícil viver comigo, é difícil ter esta consciência. É difícil ter uma vontade de ser diferente de ser melhor de querer que gostem de mim…
Depois de tudo sei que acho que sou melhor. Não sou O melhor mas melhor do que já fui.
Espelho meu – mudava a minha forma de expressar. Mudava a forma de exprimir. Digo pouco em muito, digo algo em pouco.

Olhar ao espelho

Nove de manhã, abro a janela do quarto que me dá a vista para um horizonte verde de um campo infinito.
Fico a contemplar o cheiro que entra pelo quarto – cheiro a primavera. Estou só numa imensidão de luz, o sol…
Olho para o espelho e vejo a imagem de alguém que quer saber mais, não quero ser melhor do que alguém… quero ser melhor do que aquilo que sou hoje.
Há coisas a corrigir nesse olhar expressivo… o que transmite o olhar que vejo no espelho? Por vezes nem eu, deste lado, consigo ver o que significa a expressão que sai da íris profunda…
Onde pode chegar a persistência da pessoa que está do outro lado do espelho e que afinal sou eu?
Óscar Wilde disse – Sou tão complicado que, por vezes, nem eu me entendo…
Tenho um espírito barroco, cheio de ornamentos… no entanto, gosto de simplicidade, gosto de minimalismo, gosto da perfeição…
A perfeição não existe mas o indivíduo do outro lado do espelho teima em querer atingi-la.
A persistência permitirá chegar mais longe com certeza, mas devo cuidar nos caminhos que percorro para chegar ao outro lado do espelho… há uma membrana muito fina que separa o longe do perto…

08 julho 2007

A viagem que nunca fiz... II

Contas-me os teus desejos e segredos com a voz que tanto gosto de ouvir. Ouço-te atentamente naquele cenário antes imaginado por mim. Sinto-te calma, adulta e segura de ti a cada palavra que proferes. Eu estou ali a admirar-te, é um sonho nunca tido. Primeiro uma viagem aos teus pensamentos, desejos e vontades. Depois uma admiração constante pela tua pessoa. Tens um dom de me encantar com a tua voz, tens a capacidade de me prender a ti sem que seja preciso o recurso a qualquer tipo de força. A que emites com a tua presença é mais do que suficiente para que eu me sinta de alguma forma preso a ti.
Mostras confiança em mim e confessas os desejos mais íntimos, não esperava que o fizesses mas isso demonstra o à-vontade que tens para comigo.
Confirmas que adoravas ir aonde te quero levar.
Ainda não sei se estás admirada por saberes que eu o sabia. Fico feliz por estarmos em sintonia. Memorizo, sem esforço, cada vontade tua, cada gesto de admiração por algo. Tento conhecer os teus gostos, tento saber das tuas vontades. Não mudarei por seres quem és ou por gostares do que gostas mas gosto de te conhecer, gosto de saber de ti.
Dás por ti a meio de uma conversa já longa e eu não estou cansado de te admirar.
A viagem está no início mas o caminho que fica para trás já é bom.
Voltas a uma investida. Juntas o teu corpo ao meu.
Recostas-te naquela imensidão branca dos lençóis e puxas-me para ti. O branco faz-me lembrar que estamos a começar algo. Será assim?
Pelo menos, no que à viagem diz respeito, acho que até já embarquei na tua loucura… Já me sinto envolvido.
Envolvemo-nos numa carta de viagem… um projecto de beijo.
Traço a rota, passeando com os dedos pela tua camisola sentindo as formas do teu caminho corporal. Dizes-me que queres que toque no caminho real em vez de tocar somente no mapa.
Despes a camisola e fico a admirar-te. Sou paciente, também gosto de admirar o trajecto que farei com os meus dedos pelo caminho do teu corpo. Estou a ferver por dentro. Malas repletas de vontade de viajar… contigo, nesta aventura.
Gostava de poder parar o tempo aqui mesmo, neste exacto momento. Nós os dois numa cama idêntica a um caminho limpo, a contemplar um outro caminho já usado por outros em outras descobertas, qual ninfa a meu lado.
Cruzamos os nossos caminhos, estamos juntos na mesma viagem. A viagem que nunca fiz…
Pele na pele… passagem de temperaturas… troca de cumplicidades.
Qual o nosso destino?
Agora estou com viagem marcada e já não temos retorno, é o desejo que nos leva, por caminhos nunca antes atravessados por nós.
(Continua…)

07 julho 2007

A viagem que nunca fiz... I


Comecei cedo… bastante cedo para quem está numa de viajar. Mas tudo bem quando se corre por gosto não se cansa. Preparei tudo o que me faz falta. Mochila, roupa interior, umas T-shirt mais um par de calças, as coisas do costume. Levo comigo um livro, a máquina fotográfica, e um bloco de apontamentos.
Saio de casa a pé e desço a avenida. Toca à tua campainha…
Cinco minutos e ainda a porta está fechada. Não costumas demorar tanto. És muito prática e não trazes muitas coisas contigo, daí a minha impaciência.
Vens à porta. Sobre ti, uma camisola que te dá um ar fantástico…
Dizes-me que não podes viajar comigo nesta minha ideia louca de dar a volta ao mundo contigo e viver momentos únicos. Não explicas porquê.
A princípio, fico triste mas percebo que tens uma guardada.
Olhas para mim e fazes-me uma proposta que já tinhas em mente:
- Entra e faz comigo uma viagem única.
Como um adolescente que vê a nudez feminina pela primeira vez, os meus lábios tremem… as minhas mãos ficam frias, como aliás é meu hábito ficar quando estou num momento tenso.
Fixas-me um olhar, daqueles que ainda ontem me permitiste ver. (Aquele que permite uma pequena viagem de imaginação de um momento a dois).
Entrei com passos leves. Cuidadoso para não esbarrar com um armário ou com qualquer outra coisa e estragar aquele momento com um movimento desastroso.
Percebes que estou tenso, pões-me a mão no ombro depois tocas-me na cara e dizes-me a frase que já te ouvi dizer mais do que uma vez:
“- Não tens porque te ficar nervoso… não te faço mal…”
Convidas-me a sentar mas a temperatura já está a crescer… O dia já começa a subir. Com ele, um sol alegre…
Vamos para o teu quarto que fica virado para o mar…
Abres a cortina e ficamos ali os dois sentados na tua cama a ver cada onda que se estende no areal. Vidraça enorme com travo de maresia.
O único risco no vidro – a linha do horizonte.
Perguntas-me para onde eu te quero levar na viagem que sonhei. Não quero revelar-te já porque gostava de fazer a dita viagem realmente e fazer-te uma surpresa mas insistes suavemente com os teus dedos sobre os meus a acabo por dizer:
- Quero levar-te a conhecer os Maoris… quero poder passear contigo naquelas imensas paisagens verdes… Sabes bem onde quero levar-te… Sei que gostavas de lá ir. Ouvi-te dizer um dia que era a viagem com que sonhas…
Talvez seja atrevido da minha parte querer ser eu a levar-te ou talvez ser egoísta querer ser eu a estar contigo… talvez… Por vezes, dizemos que é defeito ser-se egoísta, mas quando queremos alguém, também temos de o ser um pouco.
Começas a falar dos teus sonhos, das tuas viagens nunca feitas e também desejadas. Só não me dizes se queres companhia. Também não pergunto.
Normalmente não pergunto aquilo que não me dizes.
Não gosto de insistir. Conheces-me bem e sabes que assim sou.
Por vezes, fico curioso, não digo que não. Mas acho que se te perguntar fico curioso demais. As coisas que acontecem sem esperarmos trazem mais sabor.
Assim, começa uma investida tua. Tocas-me nas costas e dizes que sentes calor. O meu coração está na linha de partida. Corrida importante.
Tocas-me na pele, sinto a suavidade do teu toque. Nunca o tinhas feito antes. Estou a sonhar.
Pedes-me para viajar contigo sem destino dentro do espaço daquele quarto virado para o mar.
E eu, qual navegador sem rota traçada, começo uma viagem de circum-navegação à volta do mundo contigo ao leme.
Tens esse poder sobre mim.
(Continua…)

04 julho 2007

Distância

Estamos longe mas não distantes. No entanto, quando estamos próximos, há uma certa distância que nos separa.
Será que a distância existe?
Será que criamos uma distância para protegermos o nosso corpo de um impulso?
Mas por que será?
O que controla um impulso não é o corpo mas sim a mente. O corpo é o meio pelo qual a mente se liga a uma outra ou faz um corpo ligar-se a outro.
Olhamos para alguém… olhos nos olhos… o toque não existe mas o factor corporal liga as duas mentes…
Duas mãos tocam-se, trocam temperaturas… espíritos ligados… factor corporal.
Um abraço pedido… uma ligação em espera… (criarás distância?)
Hoje, a distância, é aquilo que colocamos a separar as nossas ligações… a segurar os nossos impulsos.
Conjuntura, condição, vontade, desejo, sentimento, afecto… é o que influencia a distância, é o que influencia a ligação…
O meu sentimento… não quero distância.
Teu olhar, tuas mãos, tua distância… estou ligado.

03 julho 2007

Cataloguei o teu livro

Entrada principal – o teu olhar…

Título [Determinação] / Primeira menção? Responsabilidade . – Edição? Voltava a editar o “momento” (fac-simile) . – Local? Onde quiseres menos no que já recusaste: quem edita? “tu” e eu, sem data marcada (nem início, nem fim) . - Páginas tantas (leio cada capítulo com vontade de ler mais, de tocar suavemente cada página tua, de sentir o cheiro impresso na tua pele (quero senti-la): num sentimento cheio de cor ; com dimensão ainda não medida . – (Colecção / Coligir / Juntar – os meus lábios aos teus ; repetidamente).

Notas? Anoto na memória cada apontamento teu.
Pista (dá-me uma para “te encontrar”…

Modo de Aquisição: nem compra, nem oferta, nem permuta… quero conquistar um exemplar de um beijo teu.

30 junho 2007

Momento

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Mão quente, mão fria…
Olhos nos olhos.
Estou nervoso, que faço? Pareço um adolescente
Coração numa correria…
As únicas palavras que ouço:
“- Não, não quero que seja assim…”
Nunca esperei um beijo, nunca esperei uma ligação…
Um contacto: olhos nos olhos…

Noite… mistérios da lua.

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A noite é a altura em que as pessoas se transformam.
Na noite há um tirar de máscara em que quase tudo é permitido…
De dia trabalhamos dentro de uma capa, de um estatuto. À noite, saímos da cápsula que nos abriga dos olhares. Os olhares da noite são permitidos. De noite podemos conhecer alguém com um olhar. De dia, se olhamos para alguém na rua, parece pretensioso. Na noite as coisas acontecem a uma velocidade cruzeiro.
De dia a luz permite ver demasiado, à noite conseguimos ver aquilo que queremos.
A noite tem uma duração imprevisível. Pode acabar no início, pode acabar a meia temperatura, pode acabar quente, pode também acabar ao primeiro raio da aurora. Mas a noite também pode ser o começo de algo.
Quando alguém sai para a noite, sai para passar um bom bocado, mas nem sabe o que lhe espera. Durante o dia, saímos de casa sempre com os mesmos objectivos. De dia usamos relógio, à noite é um acessório de moda.
O relógio do dia controla a vida. A noite controla os relógios da vida.
Se dormimos bem – bom dia.
Se dormimos mal – mau dia.
Se passamos uma noite – bom dia, boa noite.

Se por um lado, tiramos a capa do estatuto que temos (ou não), por outro, temos a lua que nos deixa ver ou mostrar aquilo que queremos, pois na noite as pessoas são diferentes. Na noite as pessoas são reais.
Não é no trabalho que conhecemos as pessoas, não é na rua, não é nos transportes… Conhecemos alguém… sem rosto, sem lua, sem máscara… na noite…
Durante a noite os olhos brilham o que não durante o dia.
Conhecemos bem a noite? Pensamos que a dominamos… ela domina-nos de uma forma subtil.
Deixamo-nos levar pela noite… dentro ou fora… quem escolhe?
A lua aclara os traços reais de uma face, mas esconde as máscaras do dia a dia.
A noite, conselheira dos maus dias… Ombro de descanso.
A noite, carregador de baterias… Poço de energias…
Noite, lugar das loucuras. Noite, lugar de várias temperaturas…

28 junho 2007

As cores...

Hoje é véspera de S. Pedro…
Na minha terra, há cor, alegria, música, bairrismo, etc… pela noite dentro…
Gosto de bairrismo, gosto de cor. Não gosto de fanatismo saloio que se vê nestes dias. Também visto as cores do meu bairro, também me alegro com as cores e músicas, também gosto de ver as ruas iluminadas… mas daí até ser fanático vai um longo, muito longo caminho.
As cores que as pessoas seguem têm alguma simbologia, os símbolos que ostentam, também, mas a loucura que lhes ocupa as mentes é algo mais do que gostar. É fanatismo…
As cores estão presentes nas mais diversas conotações… em Portugal o futebol reina enquanto desporto. Há diversos jornais desportivos, em dia de bola, as cores pintam as caras, vestem com rigor o mais crente adepto. No S. Pedro os Bairros arrastam massas, no quotidiano, o verde é esperança, o amarelo – alegria, o vermelho – paixão, o preto – luto, tristeza, o azul – descrição, nobreza…
As cores estão associadas a todo o tipo de ideias…
Gosto de cor, mas também gosto de descrição…
Gosto de tradição, mas também gosto de inovação…
Gosto de paixão, mas não de fanatismo…
As cores alegram, as cores chateiam, as cores elevam o ego, as cores ofuscam, as cores identificam, as cores…
As minhas cores são: preto, branco, azul, vermelho, laranja, castanho, cinzento… são todas as cores, são o aceitar das outras, são o identificar com algumas, são o sal da luz…
O amarelo no céu: ouro sobre azul…
O verde no branco: a esperança no futuro…
O vermelho no branco: uma paixão clara…

27 junho 2007

Por que escrevo…

Uns (poucos) dizem que gostam… Outros dizem que os meus escritos parecem devaneios. Se calhar até o são…
As coisas que me passam por dentro são confusas demais para se manterem em conjunto no meu interior.
É complicado gerir o meu interior. As coisas que me passam pela cabeça são difíceis de expressar. As entrelinhas dos meus escritos são escapes à minha tensão interior e exteriorizam, ou pelo menos tentam, a insatisfação dos meus dias…
Não estou a passar por uma crise existencial, até porque sei bem o caminho que piso e sei o que quero.
A revolta interior tem mais a ver com as notícias que me chegam diariamente. O mundo, as pessoas, os universos paralelos…
Acredito que, no mundo, há dois tipos de universos – o que circula à velocidade da terra, o outro aquele que veicula à vontade de quem nele vive.
Quantas vezes pensámos nas futilidades e nas frases feitas que no mundo, metade dos habitantes forçam o infortúnio da outra metade…, que alguns só andam no mundo por ver os outros andar…
Pois é, também por isso, escrevo os meus devaneios.
Prefiro alhear-me de qualquer um destes universos… Tenho o meu.
Já quase pertenci a um outro universo – o passivo… mas ainda me afirmo neste – no meu.
Hoje passo por uma fase desinteressada do meu ser. Não se trata da falta de objectivos. Trata-se de uma falta parcial de identidade… Acho que a tenho e acredito nela, mas a todo o momento sinto que ma aspiraram (também hoje mo disseram)…
Tenho a minha personalidade, defendo os meus valores, tenho o meu próprio valor… vivo no meu universo, tenho o meu mundo… só quero que me deixem vivê-lo… quero que me deixem gozá-lo…
Os que acreditam em mim, estarão comigo assim como estou com quem acredito…
Os que não acreditam… esses terão um convite para assistir à apresentação dos meus escritos, na primeira fila… eu mesmo os convidarei…

Fim de tarde com o meu avô...

Era novo…, quer dizer, ainda sou mas era mais novo.
Estava na praia e vi o meu avô. Deixei os meus amigos e sentei-me ao lado do meu melhor mestre. Ele ensinou-me o valor que mais defendo hoje.
Ironia ou não, sem saber ler nem escrever ele tinha o que de melhor se passa a um neto: valores. Valores são mais do que ensinar a dizer “por favor” e “obrigado”. Valores são aqueles sentimentos e ideias que defendemos sem pensar em factores ou influências. São o que são – hoje, amanhã, de dia ou de noite.
Esteve ele a ler as ondas do mar. O seu pão, a sua casa, o seu amigo… Com ele conversava. Dele tirava o melhor saber… Aquele olhar, perdido nas ondas que terminavam no horizonte. Mal me viu, sorriu… Que sorriso carinhoso do velho do mar!!!
Velho, o meu avô nunca foi…
Era um homem sem feitos memoráveis. Os que a terra conta com estátuas…
… mas também não tinha defeitos que lhe pudessem apontar. Não conheço quem dele tem algo a apontar…
Tirava a camisa do corpo para dar a um pobre. Dava o que o mar lhe tinha dado a um necessitado, pois a sua família, melhor ou pior, tinha algo para comer…
Admiro-o ainda hoje… O seu olhar… os seus valores, a sua sinceridade.
Um Homem daqueles que todos queria ter por amigo… um Homem…
Ao lado dele, disse-me: “Sabes, neto… amanhã vai estar um dia lindo, o mar disse-me na última onda”.
Nunca pensei que estaria senil… Ele sabia bem o que dizia…
Hoje, sou eu que vejo as respostas que ele me dá através das sétimas…
Pergunto ao meu avô, o mar responde…
A verdade é que aquele fim de tarde ficou gravado na minha memória.
O fim de tarde com o meu avô…

26 junho 2007

Dia cinzento

As sombras são cinzentas, as nuvens… nem brancas nem negras… cinzentas…
Olho em redor mas não há cor. Há uma mistura de luz com ausência dela… cor da cinza…
Não sei se o tempo está a ficar claro, se a ficar escuro…
Hoje estou a sair da bruma… ou parece que estou a entrar nela.
O que faço?
Consulto o diário de bordo… na frente – luz… cinzenta… Nada está claro.
A única certeza? A de que tenho dúvidas.
Se o cinzento existe ou se é uma mistura de branco com negro…
O meu interior está cinzento… a minha estrada é cinzenta… o meu céu… cinzento é…
Que neblina… que nevoeiro… cor de alumínio…
Ironia da frieza do alumínio…
Cinismo da incerteza da cor…
Insatisfação – nem alegria da cor, nem tristeza da escuridão…
Esperança também não… é verde…
Cinzento, hoje… simplesmente cinzento…

23 junho 2007

Silêncio... ruído ensurdecedor

Quando é sentido o vibrar do silêncio, é ensurdecedor o que passa por mim...
Que estranha forma de expressar algo sem som... pois é.
Podia falar da cor mas seria difícil porque também podia dizer que a cor não existe. São só os fragmentos de luz que se reflectem nos objectos. Então o branco serão a mistura de todos os tipos de reflexos e o negro será a ausência de luz.
Que confuso o meu pensamento, será?
Será, talvez a visão mais céptica daquilo que vejo.
Os pólos. Porquê chamar pólos ao Árctico e à Antártida? Se pólos são extremidades e o mundo é oval, porquê chamar pólos?
Com tantas contradições, podia também escrever sobre a paixão.
Porque será que utilizamos esta frase quando sentimos algo de muito forte e bom por outro alguém, quando, na realidade, esta palavra significa sofrimento. Mas afinal, estar apaixonado é mau? E o outro alguém, far-nos-á mal?
Posso falar por mim: não acho que seja assim tão mau estar apaixonado. E o outro alguém a que me refiro neste momento, também não me faz mal. Pelo menos continua a deixar-me sonhar. Com o quê? Nem eu sei. Mas não me incomoda. Não, nem um pouco. Não posso, não devo, nem quero cobrar nada que nunca me foi prometido nem nada que nunca esperei.
Se alguma vez pensei em algo de bom... Sim, pensei e não o posso esconder. Mas o tempo passa, crescemos. Quando temos 12, 13, 14 anos, parece que o mundo acaba se não ficamos com quem queremos. Ainda sonhamos em mudar o mundo. Pensamos que somos iguais aqueles heróis que fazem história e vivem na morada dos imortais. Depois começamos a crescer e a ver o mundo num nível de metro e oitenta (para quem tem essa altura). Não vemos o mundo de cima mas vemos mais coisas.
Se temos um carro baixo, podemos andar muito porque ele é aerodinâmico e tem velocidade característica dos baixinhos, mas se tivermos um carro mais alto, conseguimos ver o carro que vai à frente daquele que vai à nossa frente. Então já somos mais cautelosos e abrandamos quando o somos terceiros e o primeiro abranda, porquê? Porque já o vemos. Começamos a estar mais atentos. Apesar de sabermos conduzir, é melhor abrandar num cruzamento - um louco pode vir distraído.
Depois temos mais responsabilidades e se queremos fugir nos primeiros erros, depois percebemos (os que percebem) que não somos grandes se temos um metro e oitenta ou se temos um carr(g)o alto ou ainda se achamos que não erramos.
Então vem alguém que até pode nem saber ler nem escrever e diz: "Um (Homem) grande não é aquele que não erra, mas antes aquele que assume os seus erros"...
Começamos a ter outra visão. Porque será que depois disto eu posso pensar que aprendemos a "dominar" alguns sentimentos.
Estaremos mais frios?
Porquê se o planeta aquece à velocidade de dois graus por ano?
Porquê, se os "pólos" gelados de um mundo sem extremos, se derretem como um cubo (de duas moléculas de hidrogénio com uma de oxigénio) em cima de um fogão?
Não seremos mesmo mais frios, quando crescemos?
Será que já conseguimos perceber as distâncias que nos separam?
Será que temos receio de não dominarmos por completo aquilo que nos parece dominado pela nossa "frieza"?
Então eu pergunto. Existe frieza? Ou é só a ausência de calor?...

21 junho 2007

Tenho um ritual...

Todos os dias levanto-me, coloco o pé direito no chão em primeiro lugar. Depois das coisas normais que quase toda a gente faz, saio de casa, passeio pela rua, desço os degraus da rua ao lado da minha casa…
Encontro-me com as mesmas pessoas todos os dias… no início da rua X, passo pelo senhor de meia-idade de bicicleta. Mais abaixo, a senhora dos chapéus… todos os dias tem um diferente.
No fim da rua X, os mesmos pequenotes a correr para a escola. Nunca passei por eles mais acima, era sinal que não iam atrasados. Mas as pessoas, as ruas, as árvores… estão todas no mesmo sítio, têm sempre as mesmas cores…
Todos os dias as coisas estão no mesmo lugar…
Gostava que todos os dias fossem diferentes. Gostava que não houvesse rebanhos. Desculpem o mau jeito, mas vivemos numa sociedade de rebanhos.
Sete da manhã acordar, uma hora de transportes, trabalho a correr pois é preciso picar o ponto, meia hora o almoço a correr, novamente o trabalho, sair, transportes… dia completo… no fim do mês: ordenado para casa, carro, dois filhos, almoço fora só ao Domingo (quando dá).
Vida de rebanho.
No final disto, prefiro acordar sem o despertador, sair de casa a horas que o relógio não tem. Trabalho todos os dias num sítio diferente. Não tenho horário de entrar, nem de almoçar nem de sair… Mas saio realizado. Fim do trabalho, não é fim do dia. Passeio até casa, sempre por caminhos diferentes. Todos os dias conheço um novo caminho, todos os dias conheço novas pessoas. Todos os dias vejo as casas de cores diferentes. Todos os dias tenho um ritual… ser diferente… de tudo, de todos… Não é porque quero, se calhar é porque o sou… nem melhor, nem pior… simplesmente diferente.
O meu ritual: ser diferente, do que fui ontem e do que vou ser amanhã…
O meu ritual: ser melhor do que sou hoje… sem pensar no que serei amanhã…

20 junho 2007

Ao contrário...

Estou sentado num banco de jardim… numa praça enorme. Vejo muita gente e não conheço ninguém. Grandes edifícios de um lado… um jardim repleto de verde do meu… crianças a brincar, os avós pacientemente a educá-los… estão na paz que o jornal não conta.
Leio o jornal… diz que o mundo vai mudar de lugar… O que vou fazer? Será que vai mudar de sítio? Irá mudar de posição? Se mudar de sítio quero ir para um sítio bom. Mais perto do sol, mais perto da luz, mais perto de ti.
Se o mundo mudar de lugar pode ser que estejas mais perto.
Se o mundo mudar de posição, o que fazer? O que irá acontecer? Será que as coisas vão ficar ao contrário? Será que o nosso tecto vai ser o chão?
Os rios irão nascer no mar… - esta parte, diz o jornal que quem escreveu, foram “os loucos de Lisboa”…
Vou ler os meus livros ao contrário… Irei ler de trás para a frente? Para que lado viro a página? As histórias não terão finais tristes nem felizes… podem começar de uma dessas formas…
A direita será a esquerda, e a esquerda será a direita… o cimo vai ser em baixo, o céu será a terra… terei os pés assentes onde? O nascente terá o pôr-do-sol e o poente terá o sol de companhia pela aurora… Desceremos as escadas para cima...
E os relógios irão dar voltas de caranguejo? Se for assim, posso recuar no tempo. Posso encontrar-te primeiro.
Vou preparar-me pois o jornal diz que está para breve.
Vou ligar-te, talvez não saibas e tenho de te contar.
Pego no telemóvel, procurei o teu nome para falar contigo mas não o tinha, estou sem números na lista. Ou… espera, não tenho o teu número, não sei o teu nome…
Tenho o jornal na mão… vou procurar-te no jornal… mas as letras já começaram a mudar de sítio…
Só peço que não te mudes… não me coloques ao contrário…

19 junho 2007

O que desejo...


Quase te toquei… senti o teu olhar…
Estou ligado... completamente.
Tenho receio de um impulso. Agora estou só, mas tenho-te comigo.
Apetece-me abraçar-te, quero-te mesmo.
Hoje estou particularmente frágil. Fisicamente – sem força. Mentalmente – ligado a um sentimento muito forte.
Nunca te toquei mas tenho saudades de te ter.
Queria tocar-te, nem que seja no coração.
Queria sentir-te, nem que seja no olhar.
Discurso da procura.
O que quero encontrar?
Não sei o que busco, sei que te encontro em momentos fugazes que me dão alento e que me fazem acreditar que existes.
Não sei se te encontro, não sei se és um sonho, não sei se recebes os meus sinais.
Basta-me uma palavra…
Diz-me se existes da mesma forma que te vejo…

17 junho 2007

Números...

Viajo pelo mundo, sem ninguém a quem ligar… Parei no hotel. A recepcionista perguntou se queria algo, como é da praxe perguntar a um hóspede. Gosto de pessoas que perguntem mas não das que me chateiam com aquele sorriso amarelo.
Estou de passagem mas gostava de levar boa memória.
Subi, o quarto fica no fundo do corredor. A terceira porta à direita. Número 451. Lembrei-me dos livros… Dos que me acompanham em cada viagem que faço. Terei a sorte de encontrar um bom livro neste hotel? Já li os três que trago na mochila. O último com que me encontrei, fazia-me lembrar-te…
O número do meu quarto faz-me pensar se devo ou não entrar…
Estou cansado, quero repousar… mas… este número…
Pensei no último quarto de hotel. Treze, estava na porta. Não hesitei em pensar em… má sorte… mas entrei, passei o corpo por água… Sempre a pensar no treze…
Mais tarde pedi uma bebida… levaram-ma sem demora. Vi nos olhos do empregado que me pediu gorjeta… dou-lhe quando sair – pensei (quando dou uma gorjeta gorda, tratam-me de outra forma), no final dou-lhe…
Aproximei-me da varanda… malte no copo com duas pedras, ventoinha ligada, está calor, abro a porta da varanda… sento-me numa cadeira velha que lá está… Olho para o céu… pintaram o céu…
Que melhor poderia eu desejar para esquecer o treze da porta do quarto… um céu repleto de estrelas. Tento fazer o teu retrato… vejo-te ali… junto àquela constelação…
Consegui esquecer o treze…
Agora 451… faz-me pensar em livros… temperatura…
Estou pensativo, mas vou entrar… será que encontro o teu livro aqui…
Quero ler a tua história, estou curioso…
Viajo por várias razões… procuro-te por todo o lado… fico no hotel à espera que me ligues mas não sabes onde estou… vou à varanda e procuro-te no céu… onde estás? Presa a um número qualquer, talvez…
Em todos os hotéis e lençóis onde durmo, espero ver-te, sentir o teu cheiro… sem números de fantasia… quero ver-te a sério… tocar-te docemente… sou atrevido, quero mais do que olhar-te…
Deixei a mochila ao lado da cama… tomo um duche demorado… não sou capaz de te esquecer…
Antes do jantar, escrevo uma carta… para ti… mais um escrito… tenho alguns guardados na mochila… Não é o diário de viagem… são cartas sem morada de destino, mas são cartas para ti…
Quantas cartas tenho? Perdi a conta. Não as conto pois ficaria preso a mais um número. Iria gostar do número? Iria fazer-me pensar? … Não tenho cabeça para números, gosto mais de palavras… por isso te escrevo…
Há tanto para dizer mas não há palavras ou eu não as sei escolher…

Memória de uma noite…

São quatro da manhã, estou só… Ouço os relógios a pulsarem cada segundo que passa. Que estou a fazer… Vejo a luz do candeeiro sob a mesa. Um papel, um lápis e uma borracha estão em repouso, à espera que se lhes dê vida… O papel - suporte da obra, o lápis - ferramenta… a borracha - algo que quase não é usado. Porquê? – penso. Porque prefiro riscar, é sinal que tive uma ideia, se a apagar poderei não voltar a ela, se a riscar, há sempre a possibilidade de a ela voltar…
Um escrito, à espera de ser começado… Uma ideia abstracta à espera de se materializar para que passe à vida. As ideias, no cinzento, são incolores… as ideias no papel, branco – ganham cor.
Não sou arquitecto de ideias, sou operário. Não sou mentor delas, sou ferramenta. Não sou escritor, sou antes usado pelo lápis para que este comunique com o papel… A borracha, observadora…
Agora, o ponteiro dos minutos correu... saltou dez vezes…
Parei um pouco, o lápis soou um risco pelo papel. Um aviso. Uma ideia que ficou escondida atrás de uma fina parede de carvão… Eu vejo-a mas o lápis preferiu deixá-la ali a repousar… está a amadurecer mais um pouco… De manhã estará fresca.
Não insisto e deixo ficá-la ali… a borracha ainda sentiu que seria levantada daquela calma… Observadora, percebeu que o seu mérito é apagar o que foi mal construído, aquela ideia é só um rascunho.
Continuo em desvario. Não sei o que marca a cadência das palavras no papel: será o ponteiro dos segundos, será a marcha do carvão, será o ritmo das ondas de luz do candeeiro…
Não sei, mas parei um pouco e pensei…
Só tenho relógios digitais nesta sala, não posso ouvir os ponteiros…
Não tenho a luz acesa, já é dia…
Não tenho ideias no meu pensamento, só te tenho a ti…

14 junho 2007

Ando ser ver ninguém...

Onde estou…
Dei um passo, olhei à minha volta… ninguém…
Andei mais um pouco, continuei sem ver ninguém. Que estranho, o mundo não tem ninguém… Onde foi toda a gente? Será que fiquei aqui sozinho?
Se calhar foram a uma festa da qual não vi divulgação. Ou então foram convidados para o aniversário de alguém que não conheço.
Onde estou? Também não sei. Tenho mapa. Procuro no bolso… sem fundo, tenho o bolso cheio de nada.
Fico à espera que alguém apareça para perguntar onde encontro gente. Com aquela esperança que temos quando estamos perdidos no meio de um sítio que pensamos conhecer… Marcamos viagem, temos tudo, o trajecto marcado, não nos vamos perder com certeza. Mas quando viramos onde não devíamos ter virado… Pensamos: não há problema, encontro alguém e pergunto.
Eu continuo sem encontrar gente. Um quarteirão, ninguém, mais outro… espera. Pára!!!
Quem vem daquele lado? Uma folha caída a passear com o vento. Dois amigos.
E eu, onde quero ir? Não sei.
Procuro alguém? Sabes que sim… até acho que sei onde estás.
Estás no aniversário de alguém que não conheço… porque se tivesses numa festa, tinhas-me dito…
Desde que me senti perdido, sem ninguém, já dei… aquele número de passos que ninguém conseguiu contar…
Por onde vim? Não sei, não apareceu ninguém e vagueei…
Procuro-te, procuro alguém…
Só para perguntar… onde fica a rua onde moras?
Dá-me um mapa… uma referência de onde te posso encontrar… ou vem ter comigo…
Vamos juntos e apresentas-me o teu amigo que “faz anos” (diz-se assim)…
Ou então vamos fazer nós a festa sem divulgação.
Celebrar o quê? – perguntas tu…
O ter-te encontrado